Secretária-executiva do Ministério da Educação na gestão Temer, socióloga critica indefinição de políticas públicas e agressividade da pauta ideológica

Por Raphael Kapa

Especialistas em educação, como a professora e socióloga Maria Helena Guimarães de Castro, ainda tentam decifrar a política educacional do governo Jair Bolsonaro. A pauta ideológica, diz ela, põe em risco diversos itens da agenda do Ministério da Educação (MEC), como a avaliação de livros didáticos e a reformulação do ensino básico. Diante das erupções no ministério, estados e municípios não têm contado com a assistência necessária para implementar a Base Nacional Comum Curricular.

No epicentro das dificuldades estão o Enem – coordenado pelo Inep, uma das áreas do ministério onde o troca-troca de equipes é mais intenso – e o contingenciamento das verbas para escolas, universidades e hospitais universitários. Para Maria Helena, integrante do Conselho Nacional de Educação, o diálogo com a área econômica, setores da política e da sociedade são fundamentais para resgatar recursos.

Leia a entrevista:

O que o ministro deveria estar fazendo que não está sendo feito?

Existem tarefas emergenciais. A primeira é preparar avaliações. E ano de Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), além do Enem. Também devem apoiar a implementação da Base Nacional Comum Curricular (que norteará o que cada aluno aprenderá em cada série) – que foi discutida por mais de quatro anos e está aprovada – e criar um grupo de trabalho para discutir uma proposta de reformulação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), cujo prazo se extingue no ano que vem. E, no processo de avaliação, ainda tem a do ensino superior, o Enade. Não tenho, e não vejo quem tenha, alguma informação sobre como isso está andando.

Como a senhora vê o contingenciamento na Educação?

Acontece todo ano. Em maio de 2016 (com a entrada de Temer na Presidência), quando cheguei ao MEC, o ex-ministro (Aloizio) Mercadante (do governo Dilma) tinha feito um bloqueio devido à restrição fiscal. Fizemos uma reunião no Ministério do Planejamento para desbloquear recursos. É normal ter contingenciamento. Não se trata de uma finalidade do governo. E para buscar alternativas. O problema do MEC é a falta de diálogo.

Como ele deve ser feito?

O ministro deveria abrir um duplo diálogo. Um com o Ministério da Economia, para buscar alternativas. É necessário definir prioridades para o descontingenciamento. E, de outro lado, abrir diálogo com as universidades, que estão com os recursos de custeio basicamente congelados desde 2015. Também penso nos hospitais universitários, pois o MEC mantém 53 deles, e são a base de sustentação do Sistema Único de Saúde, o SUS.

Hoje, porém, os discursos parecem cada vez mais polarizados, não?

Quanto mais os ânimos se acirram, pior é a situação. É preciso buscar o diálogo. É o que o Ministério da Economia tem feito para discutir a reforma da Previdência, conversando com diferentes setores. O MEC precisa de uma estratégia de aproximação. É possível encontrar soluções.

0 governo fez uma troca de ministros para resolver os problemas do MEC. Funcionou?

Não sei o que mudou. Do ponto de vista ideológico, talvez sejam parecidos. Mas o modo de fazer política pública é diferente. A atual equipe é mais agressiva. Estou no Conselho Nacional de Educação. É importante ter uma relação com ele.

Na sua opinião, a pauta ideológica tem travado a pauta técnica?

Sim, ela está predominando sobre questões mais urgentes. Temos problemas concretos na educação básica, uma crise de aprendizagem, e precisamos criar estratégias bem definidas.

Como essas resoluções ou a ausência delas impactam o dia a dia da sala de aula?

O MEC está em meio a um processo de implantação, com uma equipe que chega, muda, troca, e não sabemos bem qual é o seu projeto. Isso faz com que as redes de secretarias municipais e estaduais do setor tenham um papel muito grande. Elas estão sendo as responsáveis por aplicar a Base Nacional. O ministério é fundamental para dar assistência técnica a regiões mais vulneráveis.

Por enquanto não houve atraso do Fundeb, na merenda e nos fundos ligados à manutenção da educação básica. Mas parece que já está atrasada a avaliação do Programa Nacional do Livro e do Material Didático. Os livros do 6º ao 9º ano (do ensino fundamental) possuem uma licitação muito pesada, complexa. É uma das maiores do MEC. E ela está em um processo lento.

Além das universidades, como o bloqueio pode afetar colégios e institutos federais?

A folha de pagamento e os outros contratos continuam sendo pagos, mas, nessas instituições, o contingenciamento corta o custeio e as escolas precisam de limpeza, água, luz, telefone. Quando você corta 30%, significa que os recursos aguentam até quando? É preciso fazer uma negociação para que as escolas não parem. Conto, por alto, que uns dois milhões de alunos podem ser prejudicados.

“O MEC precisa de uma estratégia de aproximação. E possível encontrar soluções”

“Quando você corta 30%, significa que os recursos aguentam até quando? É preciso fazer uma negociação para que as escolas não parem”.

Da Redação com informações do O Globo

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