Por Iara Biderman

O mito de que a detecção precoce do câncer garante necessariamente tanto o melhor tratamento quanto a cura foi o ponto central do debate sobre detecção da doença, no Fórum A Jornada do Paciente com Câncer, promovido pela Folha com patrocínio do laboratório Bristol-Myers Squibb.

“Falar em detecção precoce do câncer é uma falácia, porque o câncer não é uma, mas uma série de doenças, e muitas não têm como se detectar”, disse Artur Katz, coordenador de oncologia do Hospital Sírio-Libanês.

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Athur Katz – coordenador de oncologia clínica do hospital Sírio-Libanês. Foto: Keiny Andrade / Folha press

O oncologista participou da segunda mesa do fórum, realizada na manhã desta segunda (24), no teatro Unibes, em São Paulo, ao lado de Andreia Melo, do Grupo Oncológico D’Or e do Inca (Instituto Nacional de Câncer), e de Mariano Zalis, diretor da Progenética Hermes Pardini. A mediação foi da jornalista Cláudia Collucci, da Folha.

Zalis lembrou ser mais fácil tratar com as novas drogas as mutações das células quando ainda estão em estágios iniciais, mas que mesmo as tecnologias mais novas, como a biópsia líquida –que detecta alterações no DNA circulante no sangue–, ainda não é a solução no diagnóstico do câncer.

Para Katz, a ilusão de que a detecção precoce leva à cura por processos simples e infalíveis leva a tratamentos invasivos de doenças que não matariam o paciente, em muitos casos piorando sua qualidade de vida. Um exemplo seria a cirurgia da próstata, que pode causar incontinência urinária e impotência.

O diagnóstico precoce de tumor de tireoide e uma epidemia de cirurgias para a retirada desta glândula também foi citado pelo oncologista do Sírio-Libanês. “A tireoide é a amígdala do século 21. Na minha geração, todos tiravam a amígdala que inflamava; na de hoje, nenhuma mulher vai morrer sem ter feito cirurgia da tireoide”, disse Katz.

Andreia Melo apresentou como contraponto o fato de tumores pequenos terem maior chance de cura, com menos custos. “A maior parte das internações hospitalares é feita com a doença em estado avançado. Por exemplo, 75% das mulheres chegam ao hospital com câncer de colo do útero avançado, quando sabemos que os exames para detecção precoce reduzem de 80% a 90% o risco de desenvolver o tumor”, disse a médica.

Ela, porém, crítica o mito da “detecção total”. “O paciente chega ao consultório e diz: ‘quero exame completo, com marcador tumoral’, mas o marcador não é indicado para detecção precoce, é mais para acompanhamento da doença”, disse Melo.

A brevidade nas consultas médicas é outro complicador, que leva ao excesso de exames desnecessários, segundo os participantes do debate. “O médico já não tem tempo de ouvir e examinar o paciente adequadamente. E leva mais tempo para explicar e convencer o paciente a não fazer um exame fútil do que encaminhá-lo para o laboratório”, disse a médica.

ESTRUTURA

A necessidade de melhorar a formação de médicos e pacientes é um dos caminhos para evitar esse tipo de problema, segundo os participantes. “Os médicos sofrem concorrência desleal do Google, dos amigos, vizinhos e, principalmente, das manicures. Com 35 anos de profissão, não consigo ser tão convincente para indicar um tratamento como as manicures”, disse Katz.

Problemas estruturais da saúde pública brasileira também foram colocados em debate. “O Brasil está avançado em testes genéticos, mas a maioria da população não tem acesso a medicamentos. De que adianta o diagnóstico precoce se o médico só poderá oferecer, no máximo, um tratamento ultrapassado?, questionou Zalis.

Na ponta oposta à alta tecnologia, também foram abordados os chamados tratamentos alternativos. “Muitos produtos ‘naturais’ causam efeitos colaterais e interações indesejadas com os medicamentos. Mas há tratamentos integrativos, como meditação e acupuntura, que ajudam muito”, afirmou Katz.

Para Zalis, essas práticas podem ser até mais importantes para o curso da doença do que alguns testes. “Fazer ioga, meditação ou outras coisas que deixam a pessoa feliz mudam a regulagem epigenética (influência do entorno no genoma), não deixando alguns genes, como os preditores de doença, se manifestarem”, disse Zalis.

Da Redação com informações da Folha

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