Moro e Dellagnol. Foto: Reprodução

Entenda as consequências sobre o vazamento das conversas de Sérgio Moro e os promotores da Lava Jato

Por Redação

Uma série de reportagens do site The Intercept Brasil revelando diálogos entre o ministro da Justiça, Sérgio Moro, ex-juiz da Lava Jato, e o procurador Deltan Dellagnol, coordenador das investigações da Força-Tarefa, deve provocar uma série de desdobramentos nesta semana.

eltanOs diálogos em aplicativos de mensagens, repassados por uma fonte anônima para a reportagem, revelam uma atividade inusual de Moro como juiz.

A Força-Tarefa da Lava Jato divulgou uma nota em que não desmente os diálogos, mas trata a divulgação como criminosa.

Já o ministro da Justiça lamentou que a reportagem não revelasse a fonte das informações e considerou que as mensagens não revelam “qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado”. Moro ainda classificou a divulgação como “sensacionalismo”

Trechos de mensagens divulgadas pelo site Intercept Brasil, no início da noite de ontem, mostram que, em dados momentos da operação Lava Jato, o então juiz Sérgio Moro orientou os procuradores da Força-Tarefa, assim como fez cálculos políticos durante o processo.

“Parabéns a todos nós”, respondeu Moro as congratulações do procurador Deltan Dallagnol após uma manifestação pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em março de 2016. “Ainda desconfio muito de nossa capacidade de limpar o Congresso. O melhor seria o Congresso se autolimpar, mas isso não está no horizonte.”

Quando Dallagnol lhe informa, em dezembro do mesmo ano, que a delação de executivos da Odebrecht inclui nove presidentes, 29 ministros, 34 senadores, 82 deputados federais e 63 governadores, o juiz recomenda cautela.

“Opinião: melhor ficar com os 30% iniciais. Muitos inimigos e que transcendem a capacidade institucional do MP e do Judiciário.”

Quebrando a imparcialidade, o atual ministro da Justiça também fez sugestões a respeito de data e ordem das operações conduzidas pela Força-Tarefa e, num momento, repassou ao MP pistas envolvendo um filho do ex-presidente Lula. (Intercept)

De acordo com os editores do site, eles receberam de fonte anônima grandes arquivos que incluem mensagens privadas, gravações em áudio, vídeos, fotos e documentos.

Prometem outras reportagens para os próximos dias e afirmam que se limitarão ao que for de interesse público. O Intercept optou por não consultar os envolvidos antes da publicação — “para evitar que atuassem para impedir sua publicação e porque os documentos falam por si.” (Intercept)

Dallagnol chegou a ter dúvidas a respeito das provas colhidas para afirmar que o tríplex do Guarujá de fato pertencia a Lula. “Falarão que estamos acusando com base em notícia de jornais e indícios frágeis”, jogou no grupo Incendiários ROJ.

“Fora isso, tenho receio da ligação entre Petrobras e o enriquecimento” — sem ligar vazamentos da Petrobras ao apartamento, o caso não poderia estar com a Força-Tarefa. Em outra conversa, quando o ministro Ricardo Lewandowski chegou a autorizar uma entrevista do ex-presidente Lula antes das eleições, Laura Tessler, uma das procuradoras, revelou preocupação política. “Uma coletiva antes do segundo turno pode eleger o Haddad”, especulou. (Intercept)

O ministro Sérgio Moro soltou nota ontem mesmo — “Lamenta-se a postura do site que não entrou em contato antes da publicação”, escreveu. “Quanto ao conteúdo, não se vislumbra qualquer anormalidade ou direcionamento enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto.”

O MP também publicou nota. “A ação vil do hacker invadiu telefones e aplicativos de procuradores usados para comunicação privada e no interesse do trabalho”, afirma.

“Uma vez ultrapassados todos os limites de respeito às instituições e às autoridades, é de se esperar que a atividade criminosa continue e avance para deturpar fatos, apresentar fatos retirados de contexto, falsificar integral ou parcialmente informações e disseminar fake news.”

Artigo 254, inciso IV, do Código do Processo Penal: “O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes se tiver aconselhado qualquer das partes.”

Já faz um mês que a Polícia Federal instaurou inquérito para investigar os ataques hackers aos procuradores de Curitiba, Rio e São Paulo. Além de Moro, que divulgou um ataque ao seu celular na última semana, também o ex-procurador-geral Rodrigo Janot denunciou ação semelhante no final de abril. (Estadão).

As mensagens secretas da Lava Jato.

Celso Rocha de Barros: “Vamos ao que os vazamentos até o momento não mostram: não há falsificação de provas ou coisas do gênero. Ninguém foi inocentado pelos vazamentos do Intercept. No geral, as conclusões gerais sobre como o cartel das empreiteiras financiava todos os grandes partidos políticos continuam de pé. Mas o quadro que emerge sobre o julgamento de Lula é ruim. Não há nada nos vazamentos que prove que Lula é inocente, mas há a possibilidade real do julgamento de Lula ser contestado, e dessa vez com mais razão. Haverá argumentos jurídicos e pressão política de todos os lados, ninguém pode prever o que vai acontecer, mas o fato é que a tese de que Lula não foi julgado dentro da normalidade jurídica ganhou força. É uma hora difícil para pedir nuance e equilíbrio, mas vamos lá: a Lava Jato não foi desmoralizada, ninguém foi inocentado. Mas há bons motivos para suspeitar que não houve equidistância. O ministro Sergio Moro parece ter cruzado linhas importantes no julgamento de Lula.” (Folha)

Josias de Souza: “A Lava Jato já esteve na berlinda muitas vezes. Sobreviveu a todos os ataques. Mas nenhuma investida anterior teve o potencial corrosivo do vazamento das mensagens eletrônicas trocadas entre Moro e Dallagnol. O estrago político será inédito. O que não está claro, por ora, é se haverá prejuízo jurídico capaz de alterar sentenças passadas. A leitura das mensagens capturadas nos celulares dos personagens conduz à conclusão inequívoca de que Moro desenvolveu com Deltan uma proximidade juridicamente tóxica. Os dois combinam ações, consultam-se mutuamente. Ultrapassam a fronteira que separa o relacionamento funcional do comportamento abusivo. O então juiz por vezes adota um timbre de superioridade hierárquica, imiscuindo-se no trabalho da Procuradoria. Algo que destoa da isenção que a Constituição exige de um magistrado. A roubalheira que a Lava Jato retirou debaixo do tapete da República é colossal. Nenhum avanço, porém, autoriza juiz e investigadores a fugir do manual. Mal comparando, Moro se aproxima de Lula e do petismo quando reclama que as notícias sobre o vazamento ‘ignoram o gigantesco esquema de corrupção revelado pela Operação Lava Jato”.

Veja a íntegra da nota da força-tarefa da Lava Jato:

A força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal do Paraná (MPF/PR) vem a público informar que seus membros foram vítimas de ação criminosa de um hacker que praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e à segurança de seus integrantes.

A ação vil do hacker invadiu telefones e aplicativos de procuradores da Lava Jato usados para comunicação privada e no interesse do trabalho, tendo havido ainda a subtração de identidade de alguns de seus integrantes. Não se sabe exatamente ainda a extensão da invasão, mas se sabe que foram obtidas cópias de mensagens e arquivos trocados em relações privadas e de trabalho.

Dentre as informações ilegalmente copiadas, possivelmente estão documentos e dados sobre estratégias e investigações em andamento e sobre rotinas pessoais e de segurança dos integrantes da força-tarefa e de suas famílias.

Há a tranquilidade de que os dados eventualmente obtidos refletem uma atividade desenvolvida com pleno respeito à legalidade e de forma técnica e imparcial, em mais de cinco anos de Operação.

Contudo, há três preocupações. Primeiro, os avanços contra a corrupção promovidos pela Lava Jato foram seguidos, em diversas oportunidades, por fortes reações de pessoas que defendiam os interesses de corruptos, não raro de modo oculto e dissimulado.

A violação criminosa das comunicações de autoridades constituídas é uma grave e ilícita afronta ao Estado e se coaduna com o objetivo de obstar a continuidade da Operação, expondo a vida dos seus membros e famílias a riscos pessoais. Ninguém deve ter sua intimidade – seja física, seja moral – devassada ou divulgada contra a sua vontade. Além disso, na medida em que expõe rotinas e detalhes da vida pessoal, a ação ilegal cria enormes riscos à intimidade e à segurança dos integrantes da força-tarefa, de seus familiares e amigos.

Em segundo lugar, uma vez ultrapassados todos os limites de respeito às instituições e às autoridades constituídas na República, é de se esperar que a atividade criminosa continue e avance para deturpar fatos, apresentar fatos retirados de contexto, falsificar integral ou parcialmente informações e disseminar “fake news”.

Entretanto, os procuradores da Lava Jato não vão se dobrar à invasão imoral e ilegal, à extorsão ou à tentativa de expor e deturpar suas vidas pessoais e profissionais. A atuação sórdida daqueles que vierem a se aproveitar da ação do “hacker” para deturpar fatos, apresentar fatos retirados de contexto e falsificar integral ou parcialmente informações atende interesses inconfessáveis de criminosos atingidos pela Lava Jato.

Por fim, os procuradores da Lava Jato em Curitiba mantiveram, ao longo dos últimos cinco anos, discussões em grupos de mensagens, sobre diversos temas, alguns complexos, em paralelo a reuniões pessoais que lhes dão contexto. Vários dos integrantes da força-tarefa de procuradores são amigos próximos e, nesse ambiente, são comuns desabafos e brincadeiras. Muitas conversas, sem o devido contexto, podem dar margem para interpretações equivocadas. A força-tarefa lamenta profundamente pelo desconforto daqueles que eventualmente tenham se sentido atingidos.

Diante disso, em paralelo à necessária continuidade de seu trabalho em favor da sociedade, a força-tarefa da Lava Jato estará à disposição para prestar esclarecimentos sobre fatos e procedimentos de sua responsabilidade, com o objetivo de manter a confiança pública na plena licitude e legitimidade de sua atuação, assim como de prestar contas de seu trabalho à sociedade.

Contudo, nenhum pedido de esclarecimento ocorreu antes das publicações, o que surpreende e contraria as melhores práticas jornalísticas. Esclarecimentos posteriores, evidentemente, podem não ser vistos pelo mesmo público que leu as matérias originais, o que também fere um critério de justiça. Além disso, é digno de nota o viés tendencioso do conteúdo até o momento divulgado, o que é um indicativo que pode confirmar o objetivo original do hacker de, efetivamente, atacar a operação Lava Jato.

De todo modo, eventuais críticas feitas pela opinião pública sobre as mensagens trocadas por seus integrantes serão recebidas como uma oportunidade para a reflexão e o aperfeiçoamento dos trabalhos da força-tarefa.

Em paralelo à necessária reflexão e prestação de contas à sociedade, é importante dar continuidade ao trabalho. Apenas neste ano, dezenas de pessoas foram acusadas por corrupção e mais de 750 milhões de reais foram recuperados para os cofres públicos. Apenas dois dos acordos em negociação poderão resultar para a sociedade brasileira na recuperação de mais de R$ 1 bilhão em meados deste ano. No total, em Curitiba, mais de 400 pessoas já foram acusadas e 13 bilhões de reais vêm sendo recuperados, representando um avanço contra a criminalidade sem precedentes. Além disso, a força-tarefa garantiu que ficassem no Brasil cerca de 2,5 bilhões de reais que seriam destinados aos Estados Unidos.

Em face da agressão cibernética, foram adotadas medidas para aprimorar a segurança das comunicações dos integrantes do Ministério Público Federal, assim como para responsabilizar os envolvidos no ataque hacker, que não se confunde com a atuação da imprensa. Desde o primeiro momento em que percebidas as tentativas de ataques, a força-tarefa comunicou a Procuradoria-Geral da República para que medidas de segurança pudessem ser adotadas em relação a todos os membros do MPF. Na mesma direção, um grupo de trabalho envolvendo diversos procuradores da República foi constituído para, em auxílio à Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação da PGR, aprofundar as investigações e buscar as melhores medidas de prevenção a novas investidas criminosas.

Em conclusão, os membros do Ministério Público Federal que integram a força-tarefa da operação Lava Jato renovam publicamente o compromisso de avançar o trabalho técnico, imparcial e apartidário e informam que estão sendo adotadas medidas para esclarecer a sociedade sobre eventuais dúvidas sobre as mensagens trocadas, para a apuração rigorosa dos crimes sob o necessário sigilo e para minorar os riscos à segurança dos procuradores atacados e de suas famílias.

Da Redação com informações do UOL/FSB

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