Por Cid Célio Jayme Carvalhaes

 A formação médica no Brasil vem experimentando realismo estrutural, de fato, muito preocupante. O crescente aumento do número de Faculdades de Medicina desaguam em resultados alarmantes por inúmeros fatores. Sem lhes conferir prioridades ou enumeração por relevância há que se destacar alguns deles. O preparo de um docente de medicina demanda delongado tempo. Sem medo de erros grosseiros pode-se afirmar ser necessário período entre 16 a 20 anos, desde o primeiro ano de graduação até o pós-doutorado com titulação em determinada disciplina.

Aumentar o número de cursos de medicina não é suficiente para resolver as deficiências do sistema de saúde brasileiro. Na avaliação de Sigisfredo Brenelli, presidente da Abem (Associação Brasileira de Educação Médica), a criação de novos cursos está ocorrendo sem que seja feito um debate mais amplo com a sociedade. “O agravante é que com esse boom de novos cursos, não se investe na formação dos docentes”, afirmou.

Fácil concluir ser a maioria das atuais Faculdades de Medicina existentes no País, desprovidas de corpo docente com preparo completo, em razão de terem 15 ou menos anos de existência. Muitas delas sequer contam com aparelhagem, instrumental, instalações, hospital universitário e demais, capazes e suficientes para atenderem demanda de adequada formação. Improvisam, pura e simplesmente. Além de praticarem preços exorbitantes em suas mensalidades, não oferecem preparação condizente para os jovens médicos.

Mensuração de resultados é difícil. Embora não tenhamos avaliação formal oficial, não se pode desprezar conclusões do denominado EXAME CEMESP promovido pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, já em sua 12ª. Edição, inicialmente voluntário, porém, compulsório atualmente, para aqueles médicos recém-graduados desejosos de ali se inscreverem onde, no curso desses anos, demonstrou insuficiência de aproximadamente 60% (sessenta por cento) dos prestadores do exame.

Nunca desprezíveis são as péssimas condições de trabalho, quer no serviço público e em inúmeros serviços privados, inclusive com intermediação mercantilista do trabalho médico, deteriorando progressivamente condições assistências para a população brasileira.

Resultado previsível, crescente questionamento dos resultados obtidos. Preceitos Constitucionais garantem assistência universal para os cidadãos do País, portanto, espera-se lograr resultados assistenciais positivos, mesmo em condições desfavoráveis de doenças.

Em recente artigo publicado Felipe Fagundes Cândido relata que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais revelou levantamento estatístico revelou crescimento  de ações naquele Estado referentes  a pedidos de reparação indenizatória por erro médico. Foram publicadas 224, 284 e 349 sentenças nos anos de 2013, 2014 e 2015, respectivamente, destacando existirem nada menos que 2.301 processos ao final de 2015 pendentes de julgamento.

erro-medico-Considerações jurídicas à luz do Código Civil Brasileiro e do novo Código de Processo Civil fazem-nos concluir ser a responsabilidade médica subjetiva, exigindo provas irrefutáveis de erros calcados na figura da Culpa, que por Negligência, Imprudência ou Imperícia e mais, a obrigação do médico é de meio, excepcionalmente de resultado, considerando fatores excepcionais para tanto. Vale dizer, o Médico se obriga a atender o enfermo com a melhor da sua capacidade e utilizando das técnicas mais avançadas de tratamento, sem, entretanto, poder oferecer resultados, decorrentes dos preceitos da imponderabilidade biológica.

Ainda que preceitos legais não configurem Culpa ou eventualmente Dolo por princípio, resultados insatisfatórios e distintos dos pretendidos podem e são analisados em âmbito administrativo – Conselhos Regionais de Medicina – e na esfera judicial – Ações Penais ou Cíveis Indenizatórias. Ressalte-se ser cada instância autônoma e, um mesmo fato gerador poderá ensejar demandas em todas as competências de análises, simultaneamente, uma independente da outra, embora em algumas situações uma possa vir influenciar decisões de outra.

Ainda, no artigo referido o seu Autor transcreve julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, quando reformou sentença de improcedência formulada por paciente submetido à cirurgia bariátrica culminando com paraplegia (paralisia de membros inferiores). Apelação Cível 1.0672.10.028979-8/001, o desembargador relator assim se manifestou:

“Não é dado ao cirurgião ser tão prepotente e arrogante a ponto de realizar o procedimento sem que sejam tomadas as devidas precauções de segurança, e deixar de exigi-las conforme a lei que o rege, nem ao anestesista ser tão submisso e negligente, a ponto de sucumbir à determinação dada por profissional que não detém qualquer hierarquia em relação a si. No que se refere ao nosocômio, não é crível tamanha inocência e ingenuidade a ponto de acreditar não possuir responsabilidade quanto ao que acontece em suas dependências”.

Assistimos crescente aumento dos questionamentos sobre procedimentos médicos com resultados insatisfatórios atribuíveis a possíveis erros médicos. Há que se fortalecer a relação médico-paciente com postura de pleno acolhimento dos enfermos, atende-los nos exatos limites da lei no sentido de informações sobre todos os aspectos da doença, confirmação de diagnóstico definitivo, possibilidades de êxitos e complicações, resultados adversos, riscos inerentes à doença e às técnicas de tratamento, enfim, respeitar o consagrado direito de autonomia do enfermo e, nas circunstâncias que se afiguram, dos seus responsáveis legais, permitindo assim assistência médica segura e eficiente, ainda que a doença não permita curas, caso contrário, à cidadania se fará prevalente por intermédio de instâncias julgadoras.

Dr. Cid Célio Jayme Carvalhaes, médico neurocirurgião e advogado. Foi Presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgião, Presidente do Conselho Deliberativo da SBN, Presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo e Presidente da Federação Nacional dos Médicos. Especialista no Direito Médico e da Saúde e Coordenador do Curso de Pós Graduação em Direito da Escola Paulista de Direito.

(Colunista do Blog Agenda Capital)

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