STF julga limite para compartilhamento de dados fiscais. Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Proposta que muda forma de escolha de ministros do STF surpreende a Corte e pode se tornar obstáculo à indicação de Moro

Por Renato Souza 

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), decidiu colocar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altera a forma de provimento dos cargos no Supremo Tribunal Federal (STF) como um dos 10 assuntos prioritários para este ano. O ato de Alcolumbre surpreendeu os integrantes da mais alta Corte do país e gerou fortes reações nos bastidores. De acordo com a PEC, os ministros do STF passariam a ser escolhidos pelo presidente da República entre os integrantes de uma lista tríplice. Os votantes seriam representantes do Poder Judiciário, o procurador-geral da República e o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Aliados do ministro da Justiça, Sérgio Moro, veem a medida como uma maneira encontrada pelos parlamentares para impedir que ele alcance uma cadeira no Supremo. Ex-juiz da Operação Lava-Jato, Moro aceitou o convite para entrar no governo Bolsonaro com a expectativa de assumir o posto hoje ocupado pelo ministro Celso de Mello, que, em novembro deste ano, completa 75 anos, idade limite para permanecer no plenário do Tribunal. Em 2021, será a vez de o ministro Marco Aurélio Mello encerrar seu período de atuação.

Moro é contra qualquer alteração na forma de provimento de cargos no Supremo. Atualmente, de acordo com a Constituição Federal, para ocupar uma vaga de ministro do STF, é necessário ter mais de 35 anos, menos de 65, e reputação ilibada, além de notável conhecimento jurídico.

Pela proposta, apresentada ao Legislativo pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS), os critérios permanecem os mesmos, mas a forma de escolha muda. O presidente da República passaria a ter menos poder na indicação. Uma lista com três nomes seria votada por sete entidades, entre elas, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o próprio Supremo. Após escolhido pelo presidente entre os integrantes da lista tríplice, o ministro passaria por sabatina no Senado, como já ocorre atualmente, e poderia ficar no cargo por 10 anos, vedada a recondução. Após deixar a cadeira, de acordo com o texto da PEC, o ministro ficaria impedido de se candidatar a qualquer cargo eletivo pelo prazo de cinco anos.

As regras entrariam em vigor no momento da publicação. Assim, se a proposta fosse aprovada ainda neste ano, as regras seriam alteradas já para o ingresso de sucessores dos ministros Celso de Mello e Marco Aurélio.

No Supremo, o ato de Alcolumbre foi visto com apreensão. Nos bastidores, existe a avaliação de que a medida pode não ter apoio suficiente para seguir tramitando. Os ministros preferem aguardar a evolução do tema e evitam polemizar sobe o assunto para que ele não ganhe força política. O principal receio é que dar poder a tribunais e à OAB na hora da escolha pode elevar o corporativismo, como ocorreu algumas vezes no Ministério Público Federal, onde o procurador-geral da República pode ser escolhido a partir de uma lista tríplice votada pela categoria. Muitas vezes propostas internas, voltadas para as carreiras de procuradores e subprocuradores, dominam as promessas de campanha. Por outro lado, o fato de o presidente ter mais poder de escolha cria o risco, como ocorre no MPF, de selecionar alguém que engavete denúncias contra o Executivo, proteja o presidente em caso de irregularidades e beneficie pautas do governo.

O ministro Gilmar Mendes, do STF, afirma que as discussões em torno do caso devem ser aprofundadas e acredita que ainda restam muitas dúvidas em relação a eventuais benefícios e malefícios das alterações. “Ficar discutindo proposta é muito difícil. É o caso de ter mandato? Se a resposta for positiva, qual é o prazo? Isso precisa ser discutido. Geralmente, usa-se para cortes constitucionais, e nem todas as cortes constitucionais têm mandato. Por exemplo, o modelo austríaco não tem mandato e segue a ideia da vitaliciedade com limite de idade. Isso precisa ser avaliado de maneira bastante profunda. E não se trata apenas de mandato, mas do modus operandi, o modo de escolha”, disse.

No Senado, Lasier Martins defende a proposta, que tramita desde 2015. Ele reclamou que a PEC ficou em nono lugar entre as prioridades de votações neste ano na Casa Legislativa. “Há uma expectativa e um desejo dos brasileiros de que se resolva essa matéria para acabar com aquela tendência de manter grandes delinquentes em liberdade”, disse ele na tribuna.

Modelo

A estruturação do Supremo no Brasil segue o modelo adotado pela corte constitucional dos Estados Unidos. A forma de ingresso dos ministros é semelhante, embora, por lá, os embates no Senado sejam intensos na época de escolha. Não é incomum que candidatos sejam barrados pelos parlamentares, seja por envolvimento em processos, ações controversas, ou, simplesmente, por serem alvo de polêmicas.

A advogada constitucionalista Vera Chemim, mestre em direito público administrativo pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), discorda da necessidade de alterar a forma de preencher as vagas no Supremo. “Vai contra o sistema norte-americano, que a gente adota. A forma de escolha dos ministros é praticamente uma cópia do que se faz nos Estados Unidos, onde o presidente indica e o Senado escolhe. Tem intervenções dos poderes Executivo e Legislativo. A única diferença é que, quando o Senado norte-americano sabatina, ele realmente vai aprovar ou desaprovar. Aqui no Brasil é praticamente uma convenção”, diz.

Para Vera Chemim, a criação de um mandato de 10 anos também não é positiva. “Isso vai tirar o magistrado de lá justamente quando ele está em um nível de maturidade muito grande do ponto de vista intelectual, de conhecer a jurisprudência. Eu acredito que o sistema atual seja melhor. Temos por exemplo o ex-ministro Ayres Britto, de grande atuação, que deixou a Corte aos 70 anos de idade”, completa.

:Com informações do Correio 

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