Por Cláudia Collucci

A recente proposta do ministro da Saúde, Ricardo Barros, de criar planos de saúde populares como alternativa para desafogar o SUS tem polarizado o setor, conforme ficou claro na página “Tendências/Debates” da Folha no último sábado (23).

De um lado a advogada Solange Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), defendeu que a medida é uma alternativa para quem hoje está sem convênio médico. Nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de pessoas abriram mão dos seus planos porque perderam o emprego ou não conseguem mais pagar planos particulares.

“[Esse contingente de pessoas] Não poderia ter, ao menos, a possibilidade de escolher a adesão a um plano mais básico e barato do que os ofertados hoje? Em uma sociedade fundada na livre escolha, é justo tolher outras opções?”, questiona.

Há tempos que o setor deseja a entrada de produtos mais baratos no mercado que diminuam os custos das operadoras e “caibam no bolso” dos empregadores e de pessoas físicas. Ocorre que hoje isso esbarra na atual lei que rege o mercado de planos de saúde. Pela legislação, os planos de saúde são obrigados a manter um nível de cobertura que atenda a todas as doenças da CID 10 (lista oficial da Organização Mundial da Saúde).

Mario Scheffer, professor da USP e vice-presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) sustenta que “plano popular é um barato que sai caro.”

“Por isso, não existe em nenhum país do mundo que adote sistema universal ou mecanismos coletivos para proteger a saúde dos cidadãos. Simplesmente porque saúde é um direito humano, as necessidades não são previsíveis e o risco de adoecimento não pode ser customizado em um plano promocional.”

Barros argumenta que 85% dos problemas de saúde da população poderiam ser resolvidos na atenção primária e que, portanto, poderiam ser cobertos por “planos populares”, que ficaram desobrigados a oferecer tratamentos mais complexos.

O grande gargalo hoje no país é por procedimentos de média e alta complexidade, que no ano passado consumiram 42% do orçamento do Ministério da Saúde. Consultas e outras ações de atenção básica responderam por 14%.

Do ponto de vista de mercado, a proposta é ótima e, tendo o ministro como principal defensor, tem grandes chances de passar.

Do ponto de vista de saúde do consumidor, pode significar uma grande cilada. Os atuais planos baratos, com cobertura básica, já cometem hoje inúmeros abusos. Têm uma rede credenciada de médicos reduzida, criam obstáculos e barreiras para a assistência de idosos e doentes crônicos, adotam reajustes proibitivos, além de negativas e exclusões de coberturas.

Fora o fato de que a proposta é parecida com a das chamadas clínicas populares, que oferecem consultas e exames baratos. Até em algumas estações do Metrô já é possível fazer consultas “express” por menos de R$ 100.

Mas, em ambos os modelos, essas clínicas não se responsabilizam pelo cuidado integral do paciente. Se ele descobre numa dessas consultas que tem câncer, por exemplo, ou terá que pagar o tratamento na rede privada ou recorrer ao SUS, o que é mais provável.

Sim, o consumidor tem todo direito de investir o seu suado dinheirinho em um plano de saúde “meia-boca”, que pode deixá-lo na mão numa situação de mais gravidade. Só precisa estar ciente disso para não comprar gato por lebre.

Da Redação com informações da Folha

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