Gilberto Kassab (PSD), ex-ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (28.dez.2019) Foto: Bruno Peres/MCTIC/Divulgação

Com a conquista de 648 prefeituras no primeiro turno, partido do ex-prefeito de SP comandará 21 milhões de brasileiros. Petistas perdem espaço, mas conquistam cidades fortes

Por Redação*

Gilberto Kassab está rindo e não é à toa. Fechadas as urnas e contados os votos, já é possível dizer que o PSD é a sigla mais vitoriosa no primeiro turno destas eleições para as prefeituras, confirmando o centro do espectro político como grande fiel da balança, ao lado de MDB e PP. O partido criado e comandado pelo ex-prefeito de São Paulo para acomodar políticos de centro-direita que buscavam uma aproximação com o primeiro governo da petista Dilma Rousseff alinhou-se no Congresso e na Esplanada ao governo de Michel Temer após o impeachment e tem se aproximado do governo Bolsonaro neste ano. Com essa ideologia nublada e que resiste a definições tradicionais — “não é de direita, nem de esquerda e nem de centro”, nas palavras de Kassab quando fundou a agremiação —, o PSD vem crescendo de forma constante ao longo das últimas eleições principalmente nas cidades pequenas e médias. Neste ano ganhou 107 prefeituras a mais que em 2016, atingindo um total de 648 nessa primeira rodada eleitoral.

Levando em conta os números do primeiro turno, o partido governará as cidades onde moram 9,82% da população do país, ou 21 milhões de brasileiros, o maior número de eleitores sob influência direta de uma sigla até a próxima eleição, em 2024. O MDB ganhou em 771 cidades mas, quatro anos atrás, eram 1044. Governará 9,14% da população. O PP obteve 678 municípios, um grande avanço sobre 183 municípios em relação a 2016, chegando a governar 7,15% da população no âmbito municipal. As três siglas centristas são as únicas que até agora atingiram o patamar dos 10 milhões de votos em seus candidatos a prefeito neste ano.

Personagem central

O quadro coloca (ou reafirma) Kassab como um dos principais caciques políticos do centro — mais ainda se for considerado o relativo controle que ele dispõe de sua máquina partidária ao redor do país, frente à fragmentação de “feudos” comandados por lideranças regionais do MDB, PP e PSDB — e uma figura importante nas eleições presidenciais de 2022. Com a capilaridade nacional recém ampliada, capacidade de coordenação e farta verba pública para campanhas, embora sem um candidato competitivo próprio até o momento, o apoio do PSD e especificamente de Kassab pode desequilibrar daqui a dois anos. Procurado pela reportagem do EL PAÍS, Kassab não respondeu.

Nas capitais, o destaque do partido foi a reeleição fácil no primeiro turno de Alexandre Kalil em Belo Horizonte, com 63% dos votos válidos. Recém-filiado ao PSD de Minas Gerais, Kalil foi um reforço importante para os quadros da sigla e garantiu a conquista da capital do segundo maior colégio eleitoral do país. Credencia-se desde já como um dos favoritos na disputa pelo governo de MG daqui a dois anos.

Nomes tradicionais

Mais à direita, outro grande vencedor nestas eleições é o DEM — que fortaleceu-se ao atrair o voto de conservadores que neste ano não embarcaram em candidaturas que tentaram surfar o tsunami populista conservador que varreu as urnas em 2018, algumas com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, e os “outsiders” e gestores que prevaleceram em 2016.

O eleitor conservador preferiu apostar em nomes já conhecidos da política nacional como Eduardo Paes, que levou o DEM ao segundo turno no Rio de Janeiro com 37% dos votos válidos, ou Rafael Greca, reeleito pelo partido no primeiro turno em Curitiba com 59% dos votos válidos. A sigla também elegeu com facilidade no primeiro turno em Salvador Bruno Reis com 64% dos votos válidos, candidato de ACM Neto, que deixará a prefeitura após dois mandatos.

“Não se pode dizer que os partidos dessa centro-direita saíram vencedores das eleições pois permaneceram onde sempre estiveram, apesar do avanço: no centro do poder na maioria das cidades”, afirma cientista político Francisco Fonseca, professor da Fundação Getúlio Vargas. “Agora, aquela candidatura outsider, da direita mais populista, os delegados, majores, tenentes, o empresário e o gestor, esse perfil perdeu espaço e mostra a retração do campo político bolsonarista. O presidente é o grande perdedor nessas eleições”, diz Fonseca.

Dos 13 candidatos a prefeito para os quais o presidente pediu voto nessas eleições, nove não foram eleitos e dois disputam o segundo turno. No Rio de Janeiro, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) caiu para segundo mais votado, com cerca de 30.000 votos a menos que em 2016. A grande exceção fica por conta d prefeito Marcelo Crivella, que foi ao segundo turno com 21% dos votos válidos contra Paes e se tornou a principal aposta do presidente para o segundo turno. Em São Paulo Celso Russomanno ficou em quarto lugar com 10% dos votos válidos.

Renovação

Para Fonseca, o resultado obtido até agora pode ser considerado positivo também para a esquerda de uma forma geral. “As duas últimas eleições, em 2018 e 2016, aconteceram sob o signo da Lava Jato, que foi massacrante para o PT principalmente. Esta é a primeira eleição livre dessa dominação, e trouxe resultados interessantes”, diz o professor. Para ele, apesar de o PT ter perdido pelo menos 76 cidades em relação a 2016, mostrou vigor em locas importantes e ainda comanda 250 municípios. “A Marília Arraes no Recife e o bom desempenho em cidades grandes fora das capitais, como Guarulhos e Diadema, mostram que o PT está ‘juntando os cacos’ e se reorganizando, apesar de ainda bastante combalido”, diz.

O desempenho de Guilherme Boulos, que pela primeira vez levou o PSOL ao segundo turno em São Paulo com 20% dos votos válidos, e de Manuela D`Ávila com o PCdoB e seus 29% dos votos válidos em Porto Alegre, mostram também uma renovação de nomes competitivos nesse campo político e o surgimento de novas lideranças capazes de superar a hegemonia do PT. Em São Paulo, o petista Jilmar Tatto conseguiu apenas 8% dos votos válidos.

Tanto PT como PSDB seguem vivos em disputas de segundo turno. O PT está presente em 18 dos 57 pleitos que terão o turno adicional para decidir o vencedor. O PSDB, em 17. Como todas essas cidades possuem mais de 200 mil habitantes, são centros urbanos politicamente importantes para a recuperação de eleitores e espaço nacional pelas siglas.

O PSDB perdeu 287 prefeituras em relação a 2016 e hoje comanda 512, mas mostrou-se forte na cidade de São Paulo. Bruno Covas chega ao segundo turno com 32% dos votos válidos e favorito para conseguir reeleger-se.

Doutor em ciência política, o escritor Vinícius Do Valle vê ainda o PDT voltando a disputar votos na centro-esquerda, no mesmo espaço do PSB, e uma reorganização descentralizada na esquerda. “O PT foi muito mal nas disputas do Executivo, mas foi bem em legislativos importantes”, diz. Em São Paulo o PT elegeu 8 vereadores, incluindo o mais votado, Eduardo Suplicy, que recebeu 167.552 votos. “Outro destaque foram as candidaturas identitárias que vieram muito fortes na esquerda esse ano, principalmente no PSOL: chapas coletivas, de minorias, mulheres negras e outras tiveram resultados expressivos”. Sobre o papel do presidente no pleito, Valle pondera que ele não está derrotado. “É um erro achar que Bolsonaro sai combalido dessa eleição. O presidente, afinal, aliou-se ao centrão, o grande vencedor, e participa dessa vitória de alguma forma”, finaliza.

*Com informações do El País 

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