Nesta época tão difícil do nosso país, sentimos a necessidade de debruçarmo-nos em análises e mais análises na tentativa de entender o entorno em que estamos inseridos. Certamente que a saúde é alvo de grandes pensamentos dos gestores, governantes, trabalhadores, usuários e estudiosos.

Para além do entendimento médio, faz-se necessário pensar a saúde de maneira global e abrangente para que identifiquemos os fatores que precisam ser corrigidos a curto, médio e longo prazo e não caiamos na armadilha do lugar comum ao afirmar que a saúde no Brasil está péssima, somente por culpa dos gestores,e por isso precisamos trocá-los, até o dia de elegermos o grande “salvador da pátria” que vai revolucionar todo o sistema.  Infelizmente utilizada como ponto fraco dos governos de todas as esferas na tentativa de contaminar a opinião pública a favor dos novos postulantes aos cargos executivos, a saúde padece de dois grandes problemas: o sistema e as novas tecnologias.

Como sabemos, a expectativa de vida da população mundial cresceu significativamente ao longo dos séculos, mas em especial nas últimas 5 décadas. Foram quase 20 anos a mais devido às novas tecnologias que permitiram mais tempo de vida, apesar de não com tanta qualidade, haja vista o exponencial crescimento das doenças degenerativas. Transformamo-nos em um corpo humano cada vez mais caro, demandando tratamentos mais elaborados, necessidades maiores de exames e cada dia mais exigentes. Ninguém aceita ser tratado pelo segundo melhor tratamento disponível. Ninguém deseja morrer antes que se esgotem todos os recursos, por mais dispendiosos que sejam.

Todos os dias, surgem novos e exorbitantes tratamentos como os antineoplásicos (medicamentos utilizado para destruir neoplasmas ou células malignas), imunossupressores (medicamentos usados para evitar a rejeição do órgão transplantado), anticorpos monoclonais entre tantos outros que superam facilmente valores de dezenas de milhares de reais por mês, por paciente. Nunca se esquecendo dos exames laboratoriais e de imagem, cada vez mais e mais complexos, e de novas órteses e próteses que aumentam os custos de uma cirurgia facilmente para centenas de milhares de reais. É, simplesmente, uma conta que não fecha.

Incautos de toda a ordem se digladiam tentando identificar as falhas pontuais – de preferência as de seu interesse – de um sistema absolutamente falido. Fala-se então que se otimizarmos a utilização de recursos, fiscalizarmos e punirmos a corrupção teremos um sistema que funcionará a contento. Ledo engano.  Claro que como gestor público, tenho absoluta certeza do precípuo valor dessas medidas, mas o alerta que faço é que isto não será suficiente.

É premente que se entenda de uma vez por todas que nenhum orçamento pensado para o próximo ano será suficiente de verdade, pois, no sistema atual o Estado terá a obrigação de arcar com os custos de tratamentos que sequer existem hoje. Querem um exemplo? A cirurgia bariátrica que hoje desponta como uma vedete no campo da obesidade sequer existia fortemente há 10 anos. E é um procedimento muito complexo porque envolve dezenas de profissionais como cirurgiões, anestesistas, enfermagem, psicólogos, nutricionistas, endocrinologista, pneumologista, cardiologista, entre tantos outros e leva de 2 a 5 anos de acompanhamento de um único paciente.

A população cada vez mais esclarecida cobra mais e mais serviços. Os governantes, em tentativas vãs, fornecem o que podem com o exíguo orçamento. E, nesse caldeirão fervente, o gestor teme chamar a sociedade civil à discussão realista, sob pena de ser linchado moralmente porque estará violando os princípios do SUS pelos quais saúde é direito de todos e dever do Estado.

Mas, a pergunta é: qual o limite? Será que os princípios do SUS já não estão sendo violados há muito tempo? Esse é um diálogo que precisamos ter. Nestes tempos de tantos ódios sendo destilados, temos um inimigo comum aos governos e suas respectivas oposições. Tenho certeza que nossa nação irá amadurecer muito ao colocar essa discussão na agenda. O preço a se pagar por esconder este problema debaixo do tapete é altíssimo.

Dr. Rommel Costa, médico cirurgião geral, gestor público, foi diretor do hospital do Paranoá, coordenador geral de saúde do Paranoá e Asa Norte.

 

 

Delmo Menezes
Gestor público, jornalista, secretário executivo, teólogo e especialista em relações institucionais. Observador atento da política local e nacional, com experiência e participação política.

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