Ministro do STF Edson Fachin. Foto: Reprodução

Decisão do relator da Operação Lava Jato contraria o procurador-geral da República, Augusto Aras, que, na semana passada, disse que só Curitiba possui 350 terabytes e 38 mil pessoas com dados depositados

Por Estadão

O relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, derrubou nesta segunda-feira (3) a decisão do presidente da Corte, Dias Toffoli, que havia determinado o compartilhamento de dados das forças-tarefa da Lava Jato com a cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR). A decisão possui efeitos retroativos, ou seja, a PGR não pode se debruçar sobre os dados já enviados.

No mês passado, durante o plantão do STF, Toffoli determinou às forças-tarefa da Lava Jato – em Curitiba, São Paulo e no Rio de Janeiro – que enviassem à PGR “todas as bases da dados estruturados e não-estruturados utilizadas e obtidas em suas investigações”. Com o retorno das atividades do tribunal, Fachin – relator da ação – analisou o caso e derrubou o entendimento de Toffoli, expondo as divisões internas do Supremo sobre os métodos de investigação da Lava Jato.

Segundo o Estadão apurou, técnicos da PGR já haviam coletado dados de Curitiba, mas ainda não haviam ido ao Rio e a São Paulo atrás de informações das investigações.

Após receber os dados, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse na semana passada que, se todo o MP tem 40 terabytes, só Curitiba possui 350 terabytes e 38 mil pessoas com dados depositados. “Ninguém sabe como foram escolhidos, quais os critérios, e não se pode imaginar que uma unidade institucional se faça com segredos”, atacou o procurador-geral da República. Segundo interlocutores de Aras, os dados da força-tarefa não estavam armazenados em canais oficiais do MPF.

Ao derrubar o entendimento de Toffoli, Fachin alegou questões processuais, apontando que o instrumento utilizado – uma reclamação – não era a via adequada no caso. Um dos principais argumentos usados pela PGR é que a negativa do envio dos dados contrariaria uma decisão do Supremo em que se discutiu o deslocamento de integrantes de Ministério Públicos.

“Decisão sobre remoção de membros do Ministério Público não serve, com o devido respeito, como paradigma para chancelar, em sede de
reclamação, obrigação de intercâmbio de provas. Entendo não preenchidos os requisitos próprios e específicos da via eleita. Pelo exposto, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, nego seguimento à reclamação e, com integral efeito ex tunc (retroativo), revogo a liminar”, concluiu Fachin.

A decisão de Toffoli, tomada em pleno recesso do STF, foi tomada em uma ação movida pela PGR sob a relatoria do ministro Fachin que questiona suposta ingerência dos procuradores ao investigar os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), quando ambos possuem prerrogativa de foro privilegiado.

“A direção única pertence ao procurador-geral, que hierarquicamente, detém competência administrativa para requisitar o intercâmbio institucional de informações, para bem e fielmente cumprir suas atribuições finalísticas”, escreveu Toffoli na decisão.

Após a decisão de Toffoli, Aras afirmou que a decisão do presidente do Supremo “reafirma a estrutura e a Organização do MP Federal, garantindo a união e as relações que devem nortear os órgãos inferiores em relação aos superiores”.

Toffoli observou que o Ministério Público Federal “é instituição una, nacional e de essência indivisível, e como tal, conta com órgão central’ que é o PGR. O ministro disse ainda que a Lava Jato, ao negar repassar informações ao PGR, cometeram “evidente transgressão”.

Críticas. A concentração de informações das forças-tarefas nas mãos de Aras é ilegal, na opinião do advogado Roberto Dias, professor de direito constitucional da FGV São Paulo. “O procurador-geral da República não é um superior hierárquico do ponto de vista funcional, não é chefe processual dos outros procuradores. Esse é o meio pensado pela PGR para extinguir a Lava Jato e reduzir os mecanismos de combate à corrupção”, afirmou Dias.

A ofensiva de Aras para enquadrar a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba lança incertezas sobre o destino da operação que desbaratou um esquema bilionário de corrupção, alterou a correlação de forças da política nacional e levou à cadeia importantes lideranças do País, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Até setembro, Aras vai decidir o futuro do grupo coordenado pelo procurador Deltan Dallagnol, mas já deixou claro que pretende impor uma “correção de rumos” com a adoção de um novo modelo de investigação, sem métodos “personalistas” nem “caixas-pretas”.

Em 10 de setembro vence o prazo para a renovação da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, grupo composto por 14 procuradores da República sob a coordenação de Deltan. Na prática, a renovação significaria manter toda a estrutura hoje disponível, não apenas de procuradores, mas também servidores de apoio, que atuam em áreas de assessoria jurídica, análise, pesquisa e informática. No Rio, o prazo é 8 de dezembro.

Já a força-tarefa em São Paulo não tem designações em bloco, ou seja, possui prazos distintos para cada um dos seus membros, mas o grupo alertou ao Estadão que o número de integrantes que atuam com dedicação exclusiva à Lava Jato pode cair pela metade a partir de setembro. “A hora é a hora de corrigir os rumos para que o lavajatismo não perdure, mas a correção de rumos não significa redução do empenho no combate à corrupção”, disse Aras, em uma live com um grupo de advogados na última terça-feira. “O lavajatismo há de passar.”

Com informações do Estadão

Delmo Menezes
Gestor público, jornalista, secretário executivo, teólogo e especialista em relações institucionais. Observador atento da política local e nacional, com experiência e participação política.

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