Foto: Reprodução

Apesar de elogiado internacionalmente, o Sistema Único de Saúde completa 30 anos impactado pelo subfinanciamento. Faltam médicos, remédios e atendimento de qualidade. Propostas dos presidenciáveis para o setor são genéricas

Por Redação

Há 30 anos, somente quem tinha carteira assinada e contribuía com a Previdência Social poderia ser atendido em hospital público. Antes do surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS), em setembro de 1988, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) era o órgão regulador da saúde pública. Hoje, 80% da população brasileira dependem do SUS para se tratar: cerca de 166 milhões de pessoas.

Reconhecido internacionalmente como um dos programas de saúde pública mais eficientes do mundo, o SUS enfrentará, nos próximos anos, um desafio que seus gestores já conhecem: o subfinanciamento. Bancar um serviço de alto custo para uma população numerosa e crescente, além do envelhecimento dos usuários, é um quebra-cabeça difícil de ser montado.

A reportagem pediu a análise de três especialistas sobre as propostas dos presidenciáveis para o setor. Eles concluíram que os candidatos focam em problemas periféricos e se esquecem do principal: a falta de dinheiro. O projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa), que ainda será votado pelo Congresso Nacional, prevê R$ 128,19 bilhões para o setor em 2019. Um incremento de R$ 1,07 bilhão em relação ao montante deste ano. Nestas eleições, nove dos 13 planos dos presidenciáveis citam a necessidade de fortalecer o financiamento da saúde pública, mas a maior parcela traz explicações vagas.

Atualmente, segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os gastos com saúde (nos sistemas público e privado) equivalem a 8% do Produto Interno Bruto (PIB). O índice é semelhante ao de países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como Reino Unido (8,4%), Espanha (8,5%), Canadá (10,1%) e Austrália (8,9%), que também possuem sistemas universais.

Ainda assim, Alcides Miranda, do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes), acredita que o SUS é “cronicamente subfinanciado”. “Isso é discutido há 30 anos, e o dinheiro continua insuficiente. Há alternativas, como aumentar taxação de produtos nocivos à saúde, como agrotóxicos. Saúde é vista como despesa, mas é investimento. Quando a população está saudável, a economia indiretamente é beneficiada”, explica.

Ao analisar as propostas dos candidatos, Miranda conclui que os programas eleitorais apresentados não são viáveis. “O discurso é oportunista, não lida com a questão substancial, que é como fazer, de onde tirar financiamento”, critica. Ele faz ainda uma reflexão. “Chegou o momento de pararmos de alimentar a indústria da doença e passarmos a promover a saúde.”

Inversão

Em 20 anos, houve uma inversão no financiamento do sistema. Na década de 1990, os municípios respondiam, em média, por 15% do investimento em saúde, mas hoje esse índice está na casa de 3%. O governo federal, que era responsável por 70%, passou para 40%. A distribuição falha de papéis e recursos entre União, estados e municípios acentua a falta de dinheiro para o SUS. “A engrenagem funciona mal. Em outros países com sistema universal, como o Canadá, a União contribui com 70%. A realidade é que os recursos foram retraídos”, pondera a médica Lígia Bahia, professora doutora em saúde pública.

“Saúde é vista como despesa, mas é investimento. Quando a população está saudável, a economia indiretamente é beneficiada”, afirma Alcides Miranda,  do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde

Mesmo com as dificuldades, ela destaca que o SUS é a alternativa para a saúde brasileira. “O nosso país tem renda média, as pessoas não podem pagar por um plano de saúde. O sistema adequado, a melhor alternativa para cuidar de todos, é ele”, defende. “As propostas dos candidatos são retóricas, mas houve avanço em relação à eleição passada. Está se falando da carência de recurso.”

“O dinheiro é pouco, e temos muitos exemplos de desperdício e de recursos mal utilizados”, diz Flávio Goulart, do Observatório da Saúde

Entre os principais avanços conquistados pelo SUS, está a redução da mortalidade infantil, o aumento para 90% no índice das mulheres que passam por partos em ambientes hospitalares, o combate à tuberculose, a criação do programa de combate à Aids, o programa de transplantes e o Programa Nacional de Imunizações (PNI), que disponibiliza 19 tipos de vacinas. O Correio entrou em contato com o Ministério da Saúde, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

Há quem fale em falta de gestão. Outros, em escassez de dinheiro. Flávio Goulart, do Observatório da Saúde, acredita que a carência é de ambos. “O dinheiro é pouco, e temos muitos exemplos de desperdício e de recursos mal utilizados”, avalia. Ele defende a criação de um imposto ou o aumento da arrecadação para financiar a saúde. “Uma parte dos impostos de produtos que impactam na saúde deveria ser empregada no setor.”

Da Redação com informações do Correio

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here