Os ex-presidentes Lula e José Sarney. Foto: Reprodução

Ex-presidente sinaliza que PT abriria mão de candidaturas estaduais para tentar voltar ao Planalto e faz giro de encontros com velhos caciques da política, da esquerda à direita

Por Redação*

De olho nas eleições de 2022, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começou a mover as suas peças no tabuleiro para a sucessão de Jair Bolsonaro (sem partido). Em cinco dias em Brasília, o principal antagonista do atual presidente promoveu uma série de reuniões em um hotel de luxo, que simbolizam o pontapé extraoficial do PT para tentar voltar ao Palácio do Planalto. Esteve com representantes de diversos espectros políticos ―da direita, do centro e da esquerda. Articulou composições em chapas eleitorais em Estados considerados chave para o seu grupo, como Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Alagoas, Amazonas e Espírito Santo. Foi o primeiro grande movimento político do petista depois que ele recuperou os seus direitos políticos, após uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

Entre a classe política, Lula tenta firmar um pacto que implicaria na formação de uma frente anti-Bolsonaro, se não para o primeiro turno das próximas eleições presidenciais, para o segundo. “Está muito claro que, independentemente de quem esteja contra o Bolsonaro no segundo turno, todos os democratas estarão ao lado do adversário do atual presidente”, disse um dos líderes partidários com quem Lula se reuniu, mas que não quis ter seu nome divulgado.

Um exemplo claro da costura que o ex-presidente Lula tem feito com vistas aos palanques estaduais para 2022 está no Rio de Janeiro. Nesta semana, Lula sinalizou que o PT abrirá mão de concorrer aos cargos majoritários em apoio a Marcelo Freixo (PSOL) para o Governo e a Alessandro Molon (PSB) para o Senado. “Um consenso entre nós é o de derrotar o bolsonarismo em 2022, sobretudo em seu berço político, o Rio de Janeiro”, disse Molon.

A alternativa contra o bolsonarismo seria não fechar portas ao PSD, que deverá filiar nos próximos meses o atual prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, que hoje estão no DEM. Lula tem relação de amizade com Paes e nos últimos dias conversou em Brasília com Maia e com o presidente do PSD, o ex-ministro Gilberto Kassab. Membro do Centrão, o PSD ocupa o Ministério das Comunicações no Governo Bolsonaro e tem cargos no segundo e terceiro escalões. Boa parte de sua bancada apoia o presidente no Legislativo. Mas, para o ano que vem, a orientação é não estar no mesmo palanque que ele e, talvez, lançar um candidato próprio à Presidência da República.

Lula ainda esteve com representantes do MDB, como o ex-presidente José Sarney, o ex-senador Eunício Oliveira e o deputado Isnaldo Bulhões. Com eles, assim como com o senador Weverton Rocha (PDT), discutiu composições para chapas eleitorais no Nordeste que poderiam até dividir palanque com Ciro Gomes, o presidenciável do PDT em constante conflito com os petistas. Uma sensação entre os partidos de esquerda é que o PSB, antes completamente alinhado com Ciro, agora, pode bandear para o PT.

Entre os representantes da centro-direita, o ex-presidente conversou com dois nomes que hoje são da base de Bolsonaro, mas que já deram suporte aos governos petistas, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (Republicanos), e a presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Kátia Abreu (PP). “Com o Marcelo discutiu-se questões locais do Amazonas e agenda legislativa. Com a Kátia, temas relacionados aos pequenos produtores rurais e à agenda internacional”, explicou Hoffmann. Ele ainda convidou o senador Fabiano Contarato (REDE) a se filiar ao PT para concorrer ao Governo do Espírito Santo.

Mais do que juntar as pontas para 2022, o ex-presidente entende que o momento de desgastar o Governo Bolsonaro é justamente agora, quando ele tem tido suas vísceras expostas na CPI da Pandemia, no Senado, que investiga a condução da gestão federal na crise sanitária causada pela covid-19. Na última semana, dois ex-ministros ―Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich― e o atual ministro da Saúde ―Marcelo Queiroga― depuseram no colegiado e referendaram a sensação de que Bolsonaro não lhes dava autonomia para atuar, agiu na contramão da ciência e em favor da disseminação de medicamentos ineficazes no combate ao coronavírus. “Da CPI é bem possível que tenhamos uma comprovação de uma série de crimes de responsabilidades do presidente Bolsonaro. Isso pode gerar um desgaste em sua imagem”, afirmou o líder do PT no Senado, Humberto Costa.

Outra linha de ação da oposição capitaneada por Lula é o de demonstrar que a crise econômica decorrente da pandemia poderia ser amenizada caso houvesse a continuidade do pagamento do auxílio emergencial de 600 reais pelos próximos meses. Uma articulação no Congresso Nacional tem ganhado força nesse sentido. Há a tentativa ainda de convocar o ministro da Economia, Paulo Guedes, para pressionar pela ampliação do auxílio.

Lula também se aproximou de embaixadores para dizer que está aberto ao diálogo e à cooperação com a comunidade internacional, com ou sem mandato político. Ele atendeu ao convite para conversar com representantes de seis países: Reino Unido, Alemanha, Argentina, Moçambique, Grécia e Cuba. No centro dos debates estavam a proteção ambiental, a pandemia de coronavírus, o acordo entre o Mercosul e a União Europeia e o apoio do Brasil aos países mais pobres. “Os embaixadores querem saber como o Lula está vendo o Brasil. E ele queria ouvir dos diplomatas como nós estamos sendo vistos lá fora”, afirmou a presidenta do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann, que participou da maioria dos encontros.

“O movimento do Lula em Brasília é para tentar melhorar sua imagem, que ficou manchada depois de sua prisão. Quer se mostrar como uma pessoa de diálogo, independentemente de quem seja o interlocutor”, diz o cientista político David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB). “Agora, ele está, de fato, assumindo o seu papel de candidato”, acrescenta o especialista.

Nos próximos meses, o ex-presidente deverá retomar uma agenda de viagens pelo país em reuniões restritas, já que a pandemia impede a participação em encontros mais amplos.

*Com El País 

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