
Câmara aprovou pedido de sustação de ação penal por tentativa de golpe que inclui o ex-presidente; Supremo já deu indicações de que não vai acatar decisão de deputados
Por Gabriel de Sousa
BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira, 7, projeto que suspende processo penal por tentativa de golpe contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) no Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão também beneficia o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os outros 32 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por atos golpistas.
A proposta foi aprovada com amplo apoio dos partidos do Centrão e da oposição. Foram 315 a favor e 143 contra. Mas a última palavra deve ser do STF que já deu indicações de que não vai acatar a decisão dos deputados.
A decisão da Câmara está baseada numa interpretação da Constituição. Emenda aprovada em 2001 estabeleceu que senadores ou deputados, por maioria, podem travar uma ação penal contra congressistas. O texto constitucional faz referência a processos contra parlamentares e não cita outros acusados sem mandato.
O relator da proposta, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), alegou que a Constituição diz que pode ser trancada uma “ação penal”, sem fazer restrição a outros denunciados. Já os governistas sustentam que essa interpretação está errada e que o projeto aprovado não deve ser respeitado pelo STF.
Ao discursar na tribuna, o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), disse que a intenção da oposição era livrar Bolsonaro e os outros denunciados dos julgamentos do STF. Ele leu o texto do projeto que estava para ser votado destacando o caráter genérico.
“Fica sustado o andamento da Ação Penal contida na Petição n. 12.100, em curso no Supremo Tribunal Federal, em relação a todos os crimes imputados”, diz o parágrafo único do projeto de resolução aprovado. O processo citado é o da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Bolsonaro, Ramagem e outros 32 denunciados por tentativa de golpe.
“Aprovar isso aqui é levar a Câmara para a irrelevância institucional. Os senhores acham que alguém aqui está dando peitada no Supremo? Isso aqui vai ser totalmente desconsiderado, porque não respeita nenhum fundamento constitucional”, disse o líder do PT na Câmara.
Na discussão da proposta, que é um projeto de resolução apresentado pelo PL, tanto a base do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto a oposição ao governo deixaram claro que o texto beneficia Bolsonaro e os outros denunciados por se referir de forma genérica ao caso sob julgamento no STF. Ou seja, a partir da decisão da Câmara o STF teria que travar a ação penal contra os 34 denunciados por tentativa de golpe.
Na tribuna da Câmara, o relator do projeto, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), avisou que a sustação não vai se restringir a Ramagem e também vai alcançar todos os acusados.
“Quem fez uma denúncia colocando todo mundo no mesmo vagão? Ou seja, quem escolheu Ramagem e os outros na mesma denúncia? O Ministério Público. O Ministério Público tinha a oportunidade de, sabendo que ele era deputado, ter o cuidado de fazer uma denúncia em apartado”, disse Gaspar.
O relator ainda sustentou que todos os crimes atribuídos a Ramagem teriam ocorrido após sua diplomação, informação que o STF não confirma e os governistas contestam.
Junto a Bolsonaro, Ramagem foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por envolvimento em uma suposta tentativa de golpe de Estado e virou réu no caso por decisão da Primeira Turma da Corte em 26 de março.
Tanto Bolsonaro quanto Ramagem são réus pelos crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa, dano qualificado e deterioração do patrimônio público tombado. Somadas, as penas para esses crimes podem chegar a 43 anos de prisão.
O PL se fundamenta num trecho da Constituição que dá à Câmara o poder se sustar o andamento de uma ação penal enquanto o parlamentar mantiver o seu mandato.
No documento enviado à Câmara, o PL alega que todos os supostos crimes imputados a Ramagem foram cometidos após a diplomação dele em 19 de dezembro de 2022. O partido usou como exemplo os atos golpistas de 8 de Janeiro. “Porquanto o crime de organização criminosa armada, que possui natureza permanente, teria se estendido até janeiro de 2023, e os demais crimes imputados teriam ocorrido no dia 8 de janeiro de 2023″, justificou.
A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) aceita pelo STF diz que, enquanto chefiava a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Ramagem auxiliou Bolsonaro a deflagrar a trama golpista, descredibilizando as urnas eletrônicas e opositores no procedimento que teria culminado na tentativa de tomada de poder. O deputado permaneceu no cargo até março de 2022, quando se descompatibilizou para se candidatar à Câmara.
A Polícia Federal (PF) afirma que Ramagem se tornou um dos principais conselheiros do ex-presidente e articulou ataques ao STF. Trocas de mensagens apontaram, segundo as investigações, que Ramagem incentivava Bolsonaro a confrontar os ministros. A defesa do deputado classificou os indícios como “tímidos” e negou envolvimento dele em atos golpistas.
No final do mês passado, o ministro do STF Cristiano Zanin, que preside a Primeira Turma do STF, enviou um ofício à Câmara para informar que o processo não pode ser sustado em sua integralidade.
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Com informações do Estadão