Especialistas disseram que o país pode ter passado pelo pico de casos do coronavírus, mas cobertura vacinal deve avançar para evitar novas variantes

Por Redação 

Desde a confirmação do primeiro caso de coronavírus no Brasil, em fevereiro de 2020, o país já enfrentou os mais diversos cenários no enfrentamento à pandemia. Nos últimos meses, impulsionados pelo surgimento da variante Ômicron, os casos de Covid-19 dispararam.

Segundo dados do Ministério da Saúde, em 3 de fevereiro de 2022, o país atingiu o maior número de novas infecções com 298.408 em 24 horas. Contudo, diferente do que o Brasil viu no início de 2021, devido principalmente à vacinação, o índice de mortes não aumentou na mesma proporção que os casos dispararam.

Na época, alguns especialistas estimaram que o pico da Ômicron iria acontecer até a segunda semana de fevereiro e depois, o país veria uma queda nos casos.

A epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Ethel Maciel, foi uma delas. À reportagem, ela disse em janeiro que o Brasil seguia os dados de outros países que fazem muitos testes e que acreditava que ainda não tínhamos atingido ao nosso pico.

Agora, no entanto, muito se especula se o país já passou pelo pico da pandemia e quais devem ser os próximos cenários do SARS-CoV-2 à medida que há o avanço da cobertura vacinal.

Para ajudar na comparação de casos com mortes, veja os gráficos abaixo.

A primeira mostra a curva de infecções no país desde o início de 2021:

Curva de casos de Covid-19 de fevereiro de 2021 a fevereiro de 2022/ Reprodução / Painel Covid Ministério da Saúde

Já a imagem abaixo mostra a evolução de óbitos por Covid-19 há um ano.

Curva de óbitos por coronavírus de fevereiro de 2021 a fevereiro de 2022/ Reprodução / Painel Covid Ministério da Saúde

Para Ester Sabino, imunologista e ex-diretora do Instituto de Medicina Tropical, que liderou o sequenciamento do genoma do coronavírus, o pico de casos da Ômicron já pode ter passado. “Tudo indica que a tendência é, nos próximos dias, vermos uma queda no número de casos — que já está acontecendo — e também nas mortes”, disse à CNN.

O mesmo é defendido pelo infectologista Fernando Bellissimo-Rodrigues, do Núcleo de Vigilância Epidemiológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP). Ele disse à CNN que “talvez o pior já tenha passado, mas isso demora um pouco para se refletir no número de mortes.”

Julio Croda, infectologista e pesquisador da Fiocruz, disse à CNN que já passamos pelo pico do coronavírus.

“Já estamos há uma semana, claramente, com queda no número de casos. Já tivemos momentos piores e esse comportamento é similar ao que ocorre em outros países: de quatro a seis semanas de subida e de quatro a seis semanas de queda”, afirma.

Bellissimo-Rodrigues explica que na epidemiologia há um fenômeno chamado ‘esgotamento de suscetíveis’ e por isso o número de infecções deve continuar a cair. “Como uma grande parcela da população já foi infectada, e outra grande parcela está imunizada, especialmente com a dose de reforço, o vírus começa a ter dificuldade de achar uma pessoa para infectar”, explicou.

Contudo, todos especialistas ouvidos pela CNN para esta reportagem afirmam que as condições de queda no número de casos diários devem ser mantidas, se, e somente se, o mundo avançar na vacinação para evitar o surgimento de novas variantes.

Surgimento de novas variantes

No começo de 2022, o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, disse que “a pandemia não está nada perto de acabar e, com o rápido crescimento da Ômicron globalmente, novas variantes devem surgir”.

Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e professor da Unesp, disse à CNN que não é impossível que surjam novas variantes.

“Mas, provavelmente, essas novas variantes não vão ter o mesmo grau de letalidade que outras cepas — graças ao avanço na vacinação.”, explicou.

Sabino aponta que existe a chance de novas variantes surgirem. “Não entendemos bem de onde veio a Ômicron e, por não compreendermos bem, é que ficamos sem saber qual a chance de acontecer de novo”, afirma.

Bellissimo-Rodrigues comenta que sempre há chance de uma nova cepa mudar o jogo.

“Em novembro do ano passado, eu teria dito que a tendência seria caminhar para uma endemia. Mas veio a Ômicron e nos surpreendeu. E isso ocorre porque há bolsões de localidades com baixa cobertura vacinal”, comenta.

O infectologista lembra regiões no mundo que foram de surgimento das variantes. “Toda vez que há um local com baixa cobertura e o vírus chega ali, ela dissemina facilmente e aumenta a probabilidade de mutações. Isso aconteceu na África do Sul com a Ômicron, na Índia com a Delta, no Amazonas com a Gama e no Reino Unido com Alfa”, disse Bellissimo-Rodrigues da FMRP.

A variante Ômicron do coronavírus foi identificada em novembro de 2021. Desde a classificação da cepa como uma variante de preocupação pela Organização Mundial da Saúde (OMS), foram detectadas diferentes outa linhagens da variante, incluindo subvariantes chamadas de BA.1, BA.1.1, BA.2 e BA.3. A linhagem  BA.2 apresenta um grande número de mutações que se diferem daquelas identificadas na cepa BA.1.

Pelo menos 57 países, incluindo o Brasil, já enviaram sequências genéticas de amostras pertencentes à subvariante aos bancos de dados internacionais. A proporção semanal de BA.2 em relação a outras sequências de Ômicron aumentou em mais de 50% durante as últimas seis semanas em vários países.

Segundo a OMS, que realiza o monitoramento constante da evolução do SARS-CoV-2, até o momento não foi possível estabelecer como e onde as subvariantes da Ômicron se originaram e evoluíram.

Sabino disse que a BA.2 merece atenção. “Ela está crescendo e se tornando a principal na África do Sul”, comenta.

Naime aponta que a subvariante já está se apresentando como variante de extrema preocupação porque se mostra com escape dos anticorpos monoclonais.

“A subvariante BA.2 é de preocupação extrema, que parecia ser menos patogênica, e num segundo momento, parece que ela vai ter uma capacidade de fugir da resposta neutralizante dos anticorpos monoclonais”, afirma.

Codra, da Fiocruz, destaca que mesmo com uma nova subvariante, como a BA.2, o cenário de 2022 é diferente do vivido em 2021.

“Como a Ômicron contaminou muitas pessoas, a combinação de infecção prévia e vacinação gera uma imunidade extremamente elevada que pode proteger a população para evitar hospitalização e óbitos, mesmo no contexto de uma nova variante”, disse o pesquisador.

Vacinação no controle do pico do vírus

Todos os pesquisadores ouvidos pela CNN destacam a vacinação como principal forma de controle do vírus.

O Ministério da Saúde lembra que é necessário avançar na vacinação no país, em especial com a dose de reforço.

O ministro Marcelo Queiroga, disse em entrevista coletiva na quinta-feira (10) que “é isso o que vai fazer a diferença. O Brasil tem uma cobertura em torno de 30% de dose de reforço, índice que precisamos ampliar.”

Segundo levantamento feito pela Agência CNN, até a quinta-feira (17), 79,28% da população no país já receberam a primeira dose, 71,05% a segunda dose e 26,80% a dose de reforço.

O painel que monitora vacinação no site da Saúde não notificou atualização sobre dados de vacinais dos estados desde 28 de janeiro de 2022.

Naime diz que pessoas “não vacinadas acabam tendo um risco individual de progressão para gravidade e morte muito alto.”

Sabino afirma que o risco das pessoas não vacinadas é que elas estão disseminando o vírus.

“O problema das pessoas não vacinadas é que elas mantêm o vírus circulando e para as pessoas que são imunossuprimidas ou muito mais velhas, as quais a vacina não funciona tão bem, os não vacinados estão colocando esses indivíduos em risco porque elas mantêm a circulação do vírus.”

Para Bellissimo-Rodrigues, não há necessidade de tornar a vacinação obrigatória, contudo, “o direito individual de não se vacinar termina quando a pessoa apresenta um risco para a saúde coletiva”, afirma.

Sabino destaca ainda que é muito importante que as pessoas tomem a dose de reforço. “Por enquanto, pouca gente tomou. No Brasil, ainda estamos atrasados com a terceira dose”, disse.

Ele afirma ainda que deve haver “equidade na distribuição de vacina, tanto a nível nacional quanto a nível global.”

“Quando Israel estava com a terceira dose adiantada, foram surpreendidos com a chegada da Ômicron. É preciso que os países mais desenvolvidos comecem a olhar e perceber que um problema global requer um esforço ordenado global. O que podemos fazer nacionalmente é nos vacinarmos, mas nas relações internacionais, procurar garantir que os países menos desenvolvidos tenham acesso à vacina”, afirma o infectologista.

Possíveis cenários do coronavírus

Um artigo publicado na revista científica The Lancet, analisa os cenários epidemiológicos em todo o mundo. De acordo com a publicação, a Covid-19 vai continuar, mas ‘o fim da pandemia está próximo’.

A estimativa da análise é que em março de 2022, uma grande proporção do mundo já terá sido infectada com a variante Ômicron, e com aumentos contínuos na vacinação contra a Covid-19, o uso em muitos países de uma dose de reforço e altos níveis de imunidade adquirida por infecção, por algum tempo os níveis globais de imunidade ao SARS-CoV-2 devem estar sempre altos.

No entanto, o artigo aponta que os impactos da futura transmissão do SARS-CoV-2 na saúde serão menores devido à ampla exposição anterior ao vírus, às vacinas regularmente adaptadas a novos antígenos ou variantes, ao advento dos antivirais e ao conhecimento de que os mais vulneráveis ​​podem se proteger durante ondas futuras, quando necessário, usando máscaras de alta qualidade e distanciamento.

Para Ester Sabino, “a tendência [da Covid] é virar uma endemia, mas tudo depende do aparecimento de novas variantes, ou alguma variante que seja resistência à vacina. Isso pode fazer com que tenhamos picos epidêmicos novamente”.

Codra afirma que a “Covid-19 está caminhando para ser uma doença endêmica porque a de letalidade associada à doença reduziu nos últimos meses, algo que já chegou a ser 20 vezes maior a influenza e hoje em dia está duas vezes maior”, disse.

A letalidade é um marcador de gravidade que indica sobrecarga de serviço de saúde, hospitalização.

De acordo com o pesquisador da Fiocruz, “quando há uma redução da letalidade, isso traz menos impacto ao serviço de saúde e, portanto, mesmo que haja um aumento importante número de casos não gera impacto nos serviços de saúde”, aponta.

O infectologista indica que isso deve ocorrer quando não houver necessidade de uso de medidas de restrição ou protetivas.

“A doença tende a ser endêmica, com períodos sazonais, onde teremos aumento de casos, eventualmente de hospitalização e óbitos, mas não viveremos mais o que vivemos no passado, principalmente no Brasil, no contexto da Gama com três ou quatro mil óbitos diários”, destaca Julio Codra.

Naime ressalta que é difícil prever um cenário a longo prazo, ainda mais com a variante BA.2.

“Na pandemia aprendemos que não existe bola de cristal. Podemos falar apenas a curto prazo. Podemos dizer que nos próximos dois meses, a tendência é que haja queda do número de casos, quedas número internação. Isso se não surgir nenhuma variante. Agora, se a BA.2 começar a predominar, podemos ter problemas entre seis, oito ou 12 semanas, afirma.

Para Bellissimo-Rodrigues, dois cenários são prováveis: “a Covid-19 pode evoluir para uma endemia, causando surtos sazonais, ou podemos ver uma nova cepa — motivada por não vacinados”, disse.

“O cenário nos próximos meses deve ser, provavelmente, de calmaria, mas é muito importante que as pessoas tomem a terceira dose”, finaliza Sabino.

Da Redação com informações da CNN

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