Por Lara Mesquita 

Diante de amplo debate que tem ocupado espaço em nossas pautas políticas, é essencial conhecer, resumidamente, as regras trazidas pela reforma política que alterou a Lei 9.096 de 1995, chamada Lei dos Partidos Políticos, bem como a Lei 9.504 de 1997, a chamada Lei das Eleições e criou o instituto das Federações Partidárias. Vamos aqui resumir a lei e a resolução da justiça, bem como apresentar questões operacionais.

Dois ou mais partidos, formais e registrados na justiça, podem se reunir em federação, que terá abrangência nacional, pedindo registro à justiça eleitoral.

Uma vez constituída, a federação passa a atuar como um partido único, com direção nacional determinada, estatuto e programa específicos dessa união, bem como com regras internas para a distribuição das vagas das listas de candidaturas em eleições proporcionais que continuarão seguindo exigências como cotas de gênero etc.

A cota de gênero precisa ser cumprida, inclusive, por cada partido da Federação de forma individual, na composição das listas.

Não há necessidade de composição de organismos estaduais e municipais, sendo o diretório de qualquer legenda de uma federação em dada circunscrição símbolo da união estabelecida, mas facultativamente pode-se constituir organismos desse tipo.

Fidelidade partidária, atividade parlamentar, lógica de suplência proporcional, arrecadação e aplicação de recursos consideram a federação como um partido. Pode haver gastos específicos dos partidos associados com a federação, e um partido da federação pode transferir recurso para outro.

De acordo com a lei, os partidos que formam uma federação continuam existindo e têm certa autonomia, o que segundo a resolução do TSE significa que os componentes da federação mantêm os números das respectivas legendas, o seu quadro de filiados e o recebimento de recursos públicos proporcionais, sobre os quais deverão continuar a prestar contas;

Os partidos federados são somados para efeito de cláusula de desempenho, e quando há separação, a performance do dissidente, ou dos desistentes, é considerada individualmente.

Uma federação não tem prazo de validade, e seu tempo mínimo é de quatro anos. A partir disso seus componentes podem se separar. Em casos com mais de duas agremiações, a manutenção de ao menos dois partidos mantém a federação ativa, desde que do interesse das legendas. A saída de uma agremiação, ou o fim de uma federação está previsto em lei, bem como a adesão a posteriori de outros partidos a uma federação existente.

Fora dos prazos legais um partido pode desistir de uma federação, ou esta pode ser extinta, mas haverá sanções legais e suspensão de acesso a recursos públicos. Importante salientar que, caso uma federação opte, a qualquer tempo, por uma fusão ou incorporação das legendas que a compõem, nenhuma punição será aplicada.

Para disputar eleição, de acordo com a lei a federação poderia ser constituída até o prazo das convenções partidárias, que para fins eleitorais ocorrem em agosto. Por ter status de partido, o STF interpretou que tal aspecto deve respeitar o prazo da lógica de consolidação de uma legenda, ou seja: seis meses antes da eleição, o que em 2022 seria 02 de abril. Em caráter excepcional, para este ano, a data foi esticada pelo STF para 31 de maio.

É possível notar que ainda existirão questões em aberto sobre as quais a justiça provavelmente terá que atuar. Dúvidas que surgirão a partir de distintas interpretações legais. O que notamos diante desse novo instrumento é que ele faz sentido se inserido em um pacote de ações que busca fortalecer os partidos políticos. Exceção feita a determinadas conceções que parecem ter o objetivo de transformar o “ideal” em “possível”, ao longo dos últimos anos esse pacote de medidas é composto por cláusula de desempenho, fim das coligações em eleições proporcionais e federação de partidos – que idealmente deveriam ter sido adotados simultaneamente.

A federação, em certa medida, dado o impedimento imposto pelo fim das coligações proporcionais e as exigências de performance eleitoral trazidas pela cláusula de desempenho, serviria para estimular aproximações e realinhamentos dentro do quadro partidário. A dificuldade é compreender quem conseguirá adotar ações desse tipo. A cláusula de desempenho, por exemplo, forçou a fusão/incorporação entre Patriota e PRP, bem como entre PC do B e PPL após o pleito de 2018. No primeiro caso os dirigentes nacionais das duas legendas entraram em guerra nos últimos meses e uma sucessão de conflitos marcou a ida dos grupos internos à justiça. Fosse tal aproximação uma federação, provavelmente conflitos teriam se atenuado e ambas teriam se separado ou pacificado. Assim, a federação pode ser a saída para partidos pequenos que buscam sobrevivência na soma de seus esforços, ou mesmo pode servir para que partidos grandes recebam, respeitadas algumas individualidades, as legendas menores. Entre grandes agremiações a federação parece difícil de ocorrer, sobretudo tendo em vista dificuldades de alinhamentos subnacionais. Aqui, certamente, conflitos e questionamentos serão observados com maior incidência.

(Texto escrito em parceria com Humberto Dantas, doutor em Ciência Política pela USP, pós-doutor em Administração Pública pela FGV, diretor do Movimento Voto Consciente e coordenador da pós-graduação em Ciência Política da FESP-SP).

Com Estadão 

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here