“Há um excesso de política nas igrejas e nos púlpitos evangélicos que faz com que algumas pessoas não se reconheçam mais em suas lideranças religiosas”, relata a cientista política Ana Carolina Evangelista, diretora-executiva do Instituto de Estudos da Religião (ISER), em entrevista a BBC News.
Por Redação
O Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trouxe à luz um dado que surpreendeu muitos analistas: a desaceleração no avanço do número de evangélicos no Brasil. Contrariando a expectativa de um crescimento vertiginoso, impulsionado pela forte presença política e midiática, os números indicam uma moderação no ritmo de expansão desse grupo religioso. De acordo com a cientista política Ana Carolina Evangelista, diretora-executiva do Instituto de Estudos da Religião (ISER), diversos fatores contribuem para essa mudança, incluindo o desencanto com o excesso de política nas igrejas, a reação da Igreja Católica e a insatisfação de jovens de famílias evangélicas.
O desgaste da política nos púlpitos
Um dos principais elementos apontados por Evangelista é o “excesso de política nas igrejas e nos púlpitos evangélicos”. Segundo a pesquisadora, essa forte inclinação política de algumas lideranças religiosas tem gerado um desgaste entre os próprios evangélicos, fazendo com que muitos fiéis não se reconheçam mais em seus líderes ou nas pautas que eles defendem publicamente. Esse cenário, muitas vezes, acaba por excluir membros e gerar insatisfação, especialmente entre os mais jovens.

A Calibragem do debate público
A presença marcante dos evangélicos na política, na cultura e no debate público brasileiro nos últimos anos levou muitos a supor que o crescimento da religião seria automaticamente traduzido em um avanço numérico expressivo. No entanto, Evangelista adverte que a maior visibilidade não se traduz automaticamente em filiação religiosa. “Existia essa expectativa, mas estatisticamente não é assim que acontece”, afirma.
Para a cientista política, o novo retrato traçado pelo Censo serve como uma “calibragem de rota” para o debate público, a mídia e os analistas políticos, que tendem a supervalorizar o peso evangélico no cenário nacional. Embora o grupo continue sendo o de maior crescimento no país, a um ritmo um pouco menor, a pesquisa do IBGE sugere a necessidade de uma análise mais matizada das dinâmicas sociais e religiosas brasileiras.
Fatores além da política: jovens e a reação católica
Além do excesso de política, outros fatores contribuem para a desaceleração. A pesquisa indica uma insatisfação de jovens de famílias evangélicas, que, em um “trânsito religioso”, têm se declarado “sem religião”. Essa migração sugere uma busca por caminhos que se alinhem mais com suas perspectivas e valores, distanciando-se de modelos que não os representam.
Outro ponto relevante é a reação da Igreja Católica. Historicamente hegemônica no Brasil, a Igreja Católica, que tem visto a maioria das migrações para o campo evangélico vindo de suas fileiras, tem buscado estratégias para reter seus fiéis. Isso inclui a mudança de linguagem, o incentivo a comunicadores e influenciadores jovens, e o desenvolvimento de ações voltadas para a juventude, como o Sínodo da Amazônia, que visou lidar com a migração religiosa na região.
Um mosaico religioso em constante transformação
O Censo 2022 reafirma a crescente diversidade religiosa no Brasil, um mosaico em constante transformação. Além da desaceleração evangélica, os dados mostram o aumento do número de pessoas que se declaram “sem religião” e um crescimento significativo das religiões de matriz africana, que mais do que triplicaram o número de fiéis na última década. Esse avanço das religiões de matriz africana pode ser explicado pela ampliação do debate racial no Brasil e pelo trabalho de reconhecimento e mobilização política dos povos de terreiro, o que permite uma maior liberdade e afirmação da identidade racial e da ancestralidade negra.
A diminuição do ritmo de crescimento evangélico, portanto, deve ser analisada à luz desse cenário mais amplo de pluralização religiosa, que reflete a liberdade religiosa prevista na Constituição de 1988 e um contexto de maior democracia e diversidade no país.

Implicações e perspectivas futuras
Embora a desaceleração no crescimento evangélico seja um dado importante, a cientista política não prevê grandes mudanças no cenário político brasileiro, já que os evangélicos continuam sendo uma força expressiva. Contudo, o novo retrato do IBGE, ao desafiar previsões de um Brasil de maioria evangélica, certamente influenciará as estratégias de comunicação e posicionamento das lideranças religiosas, sociais e políticas.
A importância do Censo, como um instrumento valioso para acompanhar e entender as dinâmicas sociais e religiosas do país ao longo de um século, é ressaltada por Evangelista. Apesar dos desafios na desagregação dos dados, a pesquisa oferece um panorama fundamental para a análise do complexo e diverso campo religioso brasileiro.
Com base nos dados do Censo 2022 e na análise da cientista política, percebe-se que o panorama religioso brasileiro é mais complexo e multifacetado do que se supunha. A desaceleração do crescimento evangélico não significa um retrocesso, mas sim uma evolução em um cenário de maior diversidade e liberdade religiosa.
O que você acha dessa mudança no panorama religioso brasileiro? Acredita que o excesso de política nas igrejas evangélicas realmente impactou o crescimento?
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Da Redação do Agenda Capital