O presidente da Rússia, Vladimir Putin, participa de uma reunião do gabinete ministerial em Moscou, Rússia.

África do Sul e Índia não são os únicos países para os quais Putin rejeitou viajar recentemente.

Por Roman Goncharenko

Depois de não viajar à África do Sul para a cúpula do Brics, presidente russo se ausenta também da reunião do G20 na Índia e envia seu ministro do Exterior para representá-lo. O que realmente está por trás disso?

Na Rússia, não existe a figura do vice-presidente, embora possa parecer que o ministro das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, desempenhe papéis semelhantes – ao menos no que diz respeito à política externa.

Na cúpula do G20 na Índia, neste fim de semana, Moscou não estará representada pelo presidente Vladimir Putin, mas, sim, pelo chefe da diplomacia de seu governo. Há algumas semanas, Lavrov também representou o líder russo no encontro dos países do Brics, na África do Sul.

Analistas já suspeitavam que Putin não viajaria à África do Sul, primeiramente, pelo medo de ser preso. Há alguns meses, o Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia emitiu uma mandado de prisão contra o ele.

O motivo é a suspeita de deportações ilegais de crianças durante a guerra na Ucrânia. O Kremlin rejeita as acusações e não reconhece a jurisdição do TPI. Já a África do Sul, por reconhecer a autoridade da Corte de Haia, está legalmente obrigada a extraditar os indivíduos procurados.

Índia seria “país não seguro”

Para o especialista Felix Riefer, o mandado de prisão do TPI deve ter sido, realmente, o principal motivo da recusa de Putin em viajar à África do Sul. Mas, no caso da Índia, essa não seria uma explicação igualmente óbvia, já que o país, assim como a Rússia, também não reconhece a jurisdição do Tribunal.

“A Índia não era considerada um país seguro [pela Rússia]”, afirmou Riefer, que é autor de um livro sobre a política externa russa.

Moscou tem boas conexões com a Índia desde a era soviética, mas, ao mesmo tempo, o governo em Nova Déli colabora com o Ocidente, “também com os Estados Unidos, na questão do fornecimento de armas”, acrescentou.

África do Sul e Índia não são os únicos países para os quais Putin rejeitou viajar recentemente. Segundo relatos na imprensa, ele era aguardado na Turquia em agosto, mas os planos mudaram e o líder russo recebeu seu homólogo turco, Recep Tayyip Erdogan, no balneário russo de Sochi.

Dentro dessa perspectiva, observadores sugerem que o aspecto da segurança poderia ser uma das razões pelas quais o líder russo não gosta de viajar para países considerados inseguros. Alguns mencionam como exemplo a morte recente do líder do grupo Wagner,Yevgeny Prigozhin, em uma acidente de avião na Rússia, embora haja suspeitas de que o próprio Putin possa estar por trás disso.

Para Riefer, trata-se apenas de especulação. Ele diz que a China seria o único país que estaria nos planos de viagem de Putin, com uma visita programada para outubro.

A última vez que Putin esteve presente em uma reunião do Brics foi em 2019, antes da pandemia de covid-19. Seu último encontro pessoalmente com o presidente dos EUA, Joe Biden, ocorreu em junho de 2021, em Genebra.

No encontro do G20 realizado no mesmo ano, Putin e o presidente chinês, Xi Jinping, participaram somente através de videoconferência. No G20 na Índia, ambos estarão ausentes.

Lavrov chega a Nova Déli, onde representará Vladimir Putin na cúpula do G20.

Lavrov é o “executor” de Putin

O isolamento forçado ou voluntário de Putin significaria um papel mais preponderante de Serguei Lavrov no cenário internacional?

O ministro de 73 anos é um dos colaboradores mais próximos do presidente. Em 2024, ele completará vinte anos no cargo, o que é um recorde para um membro do gabinete de Putin.

O ex-embaixador americano em Moscou, John Sullivan, afirmou em janeiro de 2023 à revista Foreign Policy que admira Lavrov pela eficiência e por ele ser “muito experiente e astuto”.

Antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, Lavrov era admirado no Ocidente, concorda Felix Riefer. Mas, desde então, ele “colocou sua reputação em risco” ao defender “a política de realinhamento do regime russo”.

Riefer não acredita que o ministro receberá o papel de substituto de Putin em termos de política externa. “Lavrov não tem absolutamente nada a dizer em termos de política externa russa, ele deve apenas aguardar as direções de Putin. Ele não é um ministro das Relações Exteriores autônomo.”

Ele não esteve próximo do planejamento da guerra de agressão russa na Ucrânia, diz Riefer. Segundo apurou o jornal britânico Financial Times, o ministro somente foi informado poucas horas antes da invasão, em 24 de fevereiro de 2022.

O ex-embaixador alemão em Moscou, Rüdiger von Fritsch, avalia de maneira semelhante o ministro russo das Relações Exteriores.

“Lavrov era e continua sendo o ‘assistente de execução’ das políticas de Putin”, disse o diplomata à DW. “Talentoso, inteligente, mas sem a estatura de um Gromyko”, analisou, se referindo ao ex-ministro soviético do Exterior, Andrei Gromyko.

Riefer acredita que a abstinência de Putin em suas viagens ao exterior terá certamente consequências à política externa russa. “Isso isola cada vez mais a Rússia, além de depender do quanto de espaço é dado a Lavrov nas negociações.”

O especialista avalia que, de modo geral, a ausência de Putin é um “sinal de fraqueza” da liderança russa, mas também da influência de instituições internacionais como o TPI, em Haia, que são tradicionalmente consideradas “relativamente impotentes”.

Com DW 

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