Voo da Gol partia de Salvador para o Aeroporto de Congonhas, em SP, na noite de sexta-feira; companhia aérea diz que ela não pôde seguir na aeronave por motivo de segurança

Por Renata Okumura

Uma mulher negra foi obrigada a se retirar de um avião da Gol, que partia de Salvador, com destino ao Aeroporto de Congonhas, zona sul de São Paulo, na noite de sexta-feira, 28, após ter dificuldade para guardar sua mochila no compartimento de bagagens dentro da aeronave e reclamar da situação.

Em vídeo publicado nas redes sociais e compartilhado pelo apresentador da TV Globo Manoel Soares, a pesquisadora Samantha Vitena narra o problema enquanto agentes se aproximaram dela. Pela gravação, é possível ouvir outros passageiros condenarem a atitude, a qual julgaram como desproporcional e racista.

Ao Estadão, o advogado Fernando Santos – que acompanhou Samantha até a unidade da Polícia Federal no Aeroporto de Salvador, onde ela prestou depoimento – disse que a situação é lamentável.

Segundo ele, Samantha teve de assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência, por ser acusada de resistência à ordem policial para ser retirada do avião. “Em nenhum momento ela se recusou a sair do avião. Apenas questionou o motivo de sofrer qualquer motivo de restrição”, afirma Santos.

Em nota, a Gol afirma que havia uma grande quantidade de bagagens para serem acomodadas a bordo e muitos clientes colaboraram despachando volumes gratuitamente. “Mesmo com todas as alternativas apresentadas pela tripulação, uma cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretos e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo”, disse.

Em razão da falta de espaço no compartimento de malas, a tripulação do voo G3 1575 (Salvador – Congonhas) da companhia aérea Gol pediu que a passageira despachasse a sua mochila. Segundo a passageira relata no vídeo, ela não queria fazer isso porque havia risco de danos ao notebook no compartimento de carga.

Com o apoio de outros dois passageiros, citados por Samantha no vídeo, ela conseguiu acomodar sua mochila. Mesmo assim, a decolagem atrasou e três agentes da PF entraram no avião, posteriormente, para retirar a passageira.

“Se eu despachasse meu laptop, ele iria ficar em pedaços. Os comissários não moveram um dedo para me ajudar. Quem me ajudou foi esse senhor e esta senhora (apontando para eles no vídeo), que em três minutos, a gente conseguiu dar um jeito e colocar minha mochila. Pelo contrário, os comissários falaram que se a gente pousasse em Guarulhos (o voo tinha como destino Congonhas), a culpa seria minha, porque eu não queria despachar a mochila. Ele teve a coragem de falar isso para mim”, disse a mulher, em pé entre os agentes federais, no corredor dentro do avião.

“A culpa não é porque o voo está mais de duas horas atrasado, a culpa seria minha. Sendo que faz mais de uma hora que eu coloquei a mochila aqui e mesmo assim o voo não decolou”, afirmou ainda Samantha no vídeo feito por outra passageira.

“Agora, tem três homens para me tirar do voo sem me falar o motivo”, disse ela se referindo aos três policiais federais que estavam ao seu lado.

Neste momento do vídeo registrado dentro do avião, o primeiro agente se aproximou e disse que ela estava faltando com a verdade. “Eu lhe disse que estou lhe tirando da aeronave por determinação do comandante”, afirmou ele. Ao questionar novamente sobre qual o motivo, o agente se aproximou de Samantha, na tentativa de pressioná-la a sair do avião.

Ela questionou se ele iria agir com violência contra ela. Neste momento, o terceiro policial federal se aproximou e disse que o comandante ordenou que ela fosse retirada. “É questão de segurança de voo”, afirmou o policial federal, que tinha em mãos um documento. Ao fundo do vídeo, é possível ouvir críticas de outros passageiros.

Após assinar o registro da ocorrência na unidade da Polícia Federal no Aeroporto Internacional de Salvador, Samantha foi realocada pela Gol em outro voo para São Paulo, ainda durante a madrugada deste sábado, 29.

Segundo o advogado, está sendo estudado o que é possível fazer para reparar os danos sofridos pela passageira, assim como para responsabilizar os envolvidos. Santos disse que Samantha está se preservando neste momento e apenas se pronunciando por meio de seus advogados.

O Estadão também tentou contato com a Polícia Federal que ainda não se pronunciou.

Fiocruz repudia expulsão e vê racismo

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), onde Samantha cursa mestrado em Bioética, repudiou o episódio, prestou solidariedade à estudante, e definiu como racismo a forma como a passageira foi tratada. “A violência racista que acomete tantas pessoas no Brasil expulsou Samantha de um voo de retorno para sua casa”, afirmou a fundação, em nota.

“A Fiocruz se solidariza à vítima e se une à indignação provocada por esse episódio, que deixa marcas profundas não apenas em Samantha, mas atinge um coletivo que sofre diariamente com as consequências psicológicas, materiais, morais, pessoais e políticas que o racismo produz na população negra brasileira”, afirma. “Nem Samantha, nem nenhuma mulher negra deve passar por momentos como este”, acrescenta.

Veja posicionamento na íntegra da Gol:

“A Gol informa que, durante o embarque do voo G3 1575 (Salvador – Congonhas), havia uma grande quantidade de bagagens para serem acomodadas a bordo e muitos clientes colaboraram despachando volumes gratuitamente. Mesmo com todas as alternativas apresentadas pela tripulação, uma cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretos e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo.

Lamentamos os transtornos causados aos clientes, mas reforçamos que, por medidas de segurança, nosso valor número 1, as acomodações das bagagens devem seguir as regras e procedimentos estabelecidos, sem exceções. A companhia ressalta ainda que busca continuamente formas de evitar o ocorrido e oferecer a melhor experiência a quem escolhe voar com a Gol e segue apurando cuidadosamente os detalhes do caso.”

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Com informações do Estadão 

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