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O papel do advogado não deve ser subestimado ou reduzido a meras formalidades processuais. Ele é o mediador entre o indivíduo e o universo da lei – muitas vezes complexo

Por Márcio Nogueira*

Quando o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) editou a Resolução nº 288/2023, uma onda de preocupação varreu a advocacia: o texto restringia, sem cerimônias, a sustentação oral – uma das mais tradicionais e efetivas ferramentas para a proteção dos direitos de homens e mulheres. Felizmente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) derrubou, em caráter liminar, as determinações, que não tinham outro objetivo senão o silenciamento do cidadão que busca no Judiciário a resolução de seus conflitos.

Além de um retrocesso no que concerne à moderna prática jurídica, a Resolução impunha violações ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ao Código de Processo Civil (CPC) e ao Código de Processo Penal (CPP) na medida em que exigia justificativas de relevância para transferir sessões virtuais para presenciais ou telepresenciais – um verdadeiro golpe contra o direito à ampla defesa. Afinal, não pode o Tribunal arrogar o juízo da importância da sustentação oral, posto que a decisão é exclusiva do advogado responsável.

Mais do que simples palavras proferidas em uma sala de audiências, a sustentação oral é a oportunidade que a defesa tem de apresentar suas alegações e contra-argumentos em tempo real, garantindo que sejam ouvidos e considerados imediatamente por aqueles que arbitrarão o desfecho da causa. O papel do advogado não deve ser subestimado ou reduzido a meras formalidades processuais. Ele é o mediador entre o indivíduo e o universo da lei – muitas vezes complexo. A tecnologia, embora seja uma ferramenta valiosa, não pode se sobrepor à humanidade da Justiça.

Na análise do caso no CNJ, o relator, conselheiro Marcello Terto, reconheceu a relevância do papel dos advogados e da exposição verbal no processo judicial. Ao enfatizar que os regimentos internos dos tribunais podem definir meios para a realização de sustentação oral desde que respeitados os limites estabelecidos na lei, ele reafirmou as bases do próprio Estado de Direito. A OAB-RO e o Conselho Federal da OAB, que tomaram parte no julgamento como “terceiros interessados”, sempre foram a favor do direito ao devido processo legal e a uma defesa plena.

Neste cenário de intensa transformação digital, com tantos avanços tecnológicos que aprimoram e facilitam o funcionamento do Judiciário, é essencial assegurarmos que os progressos não comprometam os pilares fundamentais da Justiça. Ao reverter a deliberação do TJ-RO, o CNJ apenas restaurou a praxe da sustentação oral – em que a manifestação da defesa está sincronizada com a atenção do magistrado -, demonstrando que os julgamentos, em sua essência, devem ser dialógicos, e que os advogados, como voz de seus clientes, não podem ser calados.

A advocacia, ao longo da história, tem sido uma força motriz no amparo às liberdades e na consolidação das democracias. Sem uma advocacia livre e respeitada, corre-se o risco de a balança pender para o lado dos poderosos e contra a população. A existência de advogados atuantes, com pleno direito de expressão, é garantia de um Sistema de Justiça equânime – e, consequentemente, de uma sociedade mais justa.

*Márcio Nogueira, presidente da Seccional de Rondônia da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RO)

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(As opiniões dos colunistas não refletem necessariamente a linha editorial do Agenda Capital)

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