Höcke já participou de passeata ao lado de neonazistas, como nesta em Chemnitz, na Saxônia, em setembro de 2018.

Björn Höcke, líder da AfD no Estado da Turíngia, no leste do país, tem chance de ganhar a eleição de setembro. Analistas alertam para o risco que isso criaria para a democracia alemã.

Por Hans Pfeifer

Depois da revelação de que membros do partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) teriam discutido sigilosamente em reunião com extremistas de direita planos para expulsar migrantes da Alemanha, cada vez mais analistas políticos, sobreviventes do Holocausto e pesquisadores do extremismo alertam para as consequências que a ascensão do partido pode ter para o futuro do país. O presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, pediu à sociedade alemã que se mantenha alerta. E, tendo em vista a radicalização da AfD, a discussão sobre a proibição da legenda também ganhou fôlego.

Ao mesmo tempo, pesquisas eleitorais mostram que, depois de anos na oposição, a AfD pode estar perto do poder político. O partido poderá obter seus primeiros grandes sucessos eleitorais em 2024, já que, além das eleições para o Parlamento da UE, serão realizados vários pleitos estaduais na Alemanha.

As pesquisas eleitorais colocam a sigla como a força política mais forte em estados do leste do país. No pequeno estado da Turíngia, o partido tem até mesmo chances de eleger o governador. A mais recente pesquisa coloca o partido na dianteira, com 31%. E o candidato seria justamente um de seus membros mais radicais: Björn Höcke.

Höcke é o líder da bancada da AfD no Parlamento da Turíngia. Esse ex-professor do ensino médio já participou de uma marcha neonazista. E até mesmo a executiva da AfD estava convencida, anos atrás, de que, sob o pseudônimo “Landolf Ladig”, ele teria publicado textos que eram “extremamente próximos do nacional-socialismo”, de acordo com um texto da executiva do partido. Embora Höcke tenha negado as alegações, ele se recusou a assinar uma declaração juramentada negando tudo.

Em 2017 a AfD tentou expulsar Höcke. O comitê executivo do partido iniciou um processo de expulsão após o polêmico discurso dele num evento do partido em Dresden, no qual ele criticou a forma como a Alemanha lembra o Holocausto, chamando-a de estúpida e defendendo uma “reversão de 180 graus”, e chamou o Memorial aos Judeus Assassinados da Europa, em Berlim, de “monumento da vergonha”. Mas um tribunal da Turíngia rejeitou a expulsão.

Em vez disso, o que aconteceu desde então é que o partido se radicalizou na direção de Höcke, e os apoiadores dele têm hoje grande influência sobre os rumos partidários.

Ideologia nazista: tabu na Alemanha

Desde o governo assassino dos nacional-socialistas alemães, sob o comando de seu autoproclamado “Führer”, Adolf Hitler, de 1933 a 1945, qualquer forma de aproximação ideológica ou simbólica com o nazismo é considerada politicamente inaceitável na Alemanha. Durante a era nazista, os nazistas assassinaram mais de 6 milhões de judeus europeus e foram responsáveis pelo conflito mais mortal da história mundial, a Segunda Guerra Mundial.

Mas hoje há vários integrantes da AfD que já chamaram a atenção por proximidade ideológica com o nazismo. Björn Höcke pode até mesmo ser chamado de “fascista”. Um tribunal da cidade de Meiningen decidiu em 2019 que esse é um julgamento de valor “baseado numa base factual verificável”.

E é essa a pessoa que pode se tornar, na eleição na Turíngia em setembro de 2024, o primeiro político de extrema direita na Alemanha do pós-Guerra a ser eleito para comandar o governo de um estado alemão.

O cargo tem poder político de longo alcance, já que é amplamente responsável pelas políticas de educação e mídia de seu estado. Ele também decide sobre a implementação local da política de concessão de refúgio a migrantes do governo federal. Considerando que é justamente nesse tema que a AfD exige uma mudança radical de rumo, isso poderia ter consequências graves.

Medidas contra a imprensa

Numa reunião da AfD em novembro de 2023, Höcke anunciou medidas de longo alcance caso fosse eleito: “Vamos dar um fim à luta contra a extrema direita”, prometeu, sendo aplaudido efusivamente por seus apoiadores.

Höcke, referindo-se a si mesmo na terceira pessoa, também anunciou medidas contra a mídia pública. “O que acontecerá se o Höcke se tornar governador? Ele cancelará os contratos das emissoras estatais? Sim, o Höcke fará isso, sim”, gritou, recebendo aplausos dos membros da AfD.

Devido a reportagens críticas à AfD, o partido vem pedindo há anos a abolição ou reorganização das emissoras de direito público na Alemanha. Inspirado no ex-presidente dos EUA Donald Trump, a AfD recorre à chamada “mídia alternativa” e dissemina suas ideias políticas nas redes sociais, em seus próprios canais partidários de grande alcance.

Em dezembro de 2023, o renomado blog jurídico Verfassungsblog analisou o quão realista é o cenário de um governador de extrema direita. De acordo com o artigo, o cargo político bastante discreto de presidente do Legislativo estadual é a peça central. Na Alemanha, esse cargo é tradicionalmente conquistado pelo partido que obteve mais votos na eleição estadual. E na Turíngia, a AfD está claramente à frente nas sondagens. Portanto, tem uma chance legítima de chegar a esse cargo.

“Imensos danos à democracia”

O Verfassungsblog adverte para as consequências: “O dano que um partido populista autoritário nesse cargo poderia causar à democracia como um todo é imenso”. Isso ocorre porque o presidente do Parlamento estadual organiza o funcionamento do trabalho parlamentar.

E sobretudo: na Turíngia, o presidente do parlamento estadual teria a oportunidade de nomear governador mesmo alguém que não obtivesse a maioria absoluta dos votos na assembleia. Uma maioria simples de votos seria suficiente na terceira rodada de votação entre os parlamentares.

E tudo indica que isso só poderia ser evitado por meio de uma aliança pouco comum: os conservadores da CDU e a esquerda socialista de A Esquerda teriam que se acertar sobre um candidato opositor comum. Mas ambos os partidos são adversários políticos ferrenhos na Alemanha – e mais ainda na Turíngia.

Petição pede perda de direitos

Em janeiro de 2024, ativistas contra a extrema direita lançaram uma petição direcionada às bancadas parlamentares (exceto a da AfD) pedindo que Höcke perca seus direitos fundamentais, entre eles as liberdades de expressão e de reunião e também os direitos de votar e ser votado e de ocupar cargos públicos. 

Mais de 1,2 milhão de pessoas já assinaram a petição. Base para ela é o artigo 18 da Lei Fundamental (Constituição), que prevê a perda de direitos fundamentais daqueles que os usarem para lutar contra a democracia alemã.

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Com informações do Deutsche Welle – DW

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