Foto: Reprodução.

No País, movimento global ganhou impulso com a pandemia e tem sido marcado, sobretudo, pelos mais escolarizados e jovens

Por Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira

Em novembro do ano passado, Renata Lopes, de 36 anos, decidiu por um fim a sua insatisfação profissional. Com apenas oito meses ocupando um cargo de gerente de compras numa startup, ela optou por se desligar da companhia e voltou a se dedicar exclusivamente ao seu negócio próprio – uma empresa que vende produtos de segurança. “Foram diversos fatores (que levaram a essa decisão). Era o cargo, a empresa. Tinha também a questão da distância”, conta.

Em 2022, Renata se somou a quase 6,8 milhões de brasileiros – o equivalente a toda população do Maranhão – que pediram demissão de forma voluntária, um terço do total de desligamentos registrados no País, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) compilados pela LCA Consultores.

No Brasil, o movimento – que ficou conhecido globalmente por grande renúncia – foi marcado, sobretudo, pelos mais escolarizados e jovens. Entre os trabalhadores com pós-graduação, a demissão voluntária superou os 50% para essa faixa de escolaridade. “Boa parte desse movimento está atrelado a esse processo de normalização, com as pessoas voltando a ter empregos mais condizentes com a sua formação”, afirma Bruno Imaizumi, economista da LCA e responsável pelo levantamento.

Em 2020, por exemplo, quando a economia foi abalada pelos impactos provocados pela pandemia de covid, os desligamentos voluntários representavam 25,7% do total. “Há dois ‘Brasis’ no mercado de trabalho formal. A grande maioria tem uma mão de obra pouco qualificada, mas quem tem um pouco mais de qualificação tem um pouco mais de poder de barganha”, diz Imaizumi.

Com duas pós-graduações no currículo, Renata diz que seu empreendimento “roda sozinho” e, portanto, segue em busca de um trabalho. “Eu até participo de um ou dois processos seletivos por mês, mas nada que me agrade”, diz. “Uma hora vai aparecer uma coisa bacana.”

Esse movimento já vinha surgindo antes da pandemia, mas ganhou outra dimensão no pós-covid. O presidente da multinacional de recursos humanos Adecco, André Vicente, explica que a questão do bem-estar e qualidade de vida passou a ter uma relevância maior para essa população mais qualificada, que não pensa duas vezes antes de deixar o emprego mesmo sem ter algo vista. “Alguns deles, apostam em trabalhos autônomos, em negócios digitais, no empreededorismo.”

Outro fator é o desequilíbrio entre oferta e demanda de mão de obra em alguns setores, como tecnologia, saúde e mercado financeiro. Vicente afirma que, nesse cenário, as empresas são muito competitivas para atrair o trabalhador. “Isso também foi reflexo da pandemia, pois exigiu que as companhias acelerassem o processo de digitalização, o que demandou muita mão de obra qualificada.”

Mais jovens também se demitem

Junta-se a tudo isso uma questão geracional, em que os jovens seguem uma filosofia de próposito e “fit cultural”. Ou seja, não basta ter um emprego. A cultura organizacional da empresa precisa estar de acordo com a sua personalidade e crenças.

Em 2022, o desligamento voluntário entre os que têm de 18 a 24 anos chegou a 39% do total da faixa etária e representou 34% das demissões dos 25 a 39 anos, resultados bem acima do observado na faixa dos 50 a 59 anos (24%). “Se a gente for analisar uma geração mais antiga, o sinônimo de sucesso era ficar anos numa mesma empresa, crescer na empresa. O mais jovem, não. Se encontra uma melhor oportunidade no mercado de trabalho, ele se movimenta”, afirma o economista da LCA.

Um exemplo é Marília Gabriela Fechio, de 34 anos. Formada em publicidade, com uma pós-graduação no currículo e cursando um mestrado, ela sempre prezou pela sua saúde emocional e reconheceu os seus limites. Nem sempre tinha a garantia de um trabalho nas suas trocas de emprego. “Do meu último emprego CLT, me demiti por motivos de insalubridade mesmo, por ocorrência de sobrecarga emocional e racismo”, conta ela.

Renata estava insatisfeita no trabalho e pediu demissão em novembro do ano passado Foto: TABA BENEDICTO / ESTADAO

Antes da crise sanitária, ela pondera que tinha alguma “flexibilidade” a mais para lidar com um ambiente de trabalho eventualmente mais difícil. “Depois da pandemia, veio muito mais um senso de urgência, de imediatismo (das empresas). Isso acabou pesando, tanto que, na minha área, nas minhas equipes, tinha sempre alguém sendo afastado por questões psicológicas.”

No mundo, essa onda deixou evidente aspectos comportamentais. Em 2021, na esteira desse movimento, mais de 40 milhões de pessoas se demitiram dos seus trabalhos. André Vicente, da Adecco, diz que na Europa esse movimento é ainda mais intenso que no Brasil. E deve continuar em alta. Exemplo disso é que alguns países estão abrindo suas fronteiras para atrair estrangeiro. Vide o caso de Portugal, que flexibilizou a entrada de brasileiros no país, destaca o executivo.

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Com informações do Estadão

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