Por Paulo Queiroz

Porque já as eleições dos “nossos” representantes são realizadas de modo a institucionalizar o crime, pois os grupos econômicos, ao patrocinarem a eleição de Presidente, Governadores, Prefeitos etc., assim o fazem, como é natural, sob a condição de obterem financiamentos graciosos, participarem de licitações premiadas, privatizarem o espaço público, multiplicando lucros;

Porque num tal contexto, a política passa a constituir extraordinário atrativo para criminosos profissionais, em geral burocratas medíocres, desqualificados moral e tecnicamente, sem perspectiva fora da política;

Porque certos partidos políticos passam a funcionar, assim, como autênticas quadrilhas, cujos membros seguem a lógica do quem dá mais, por isso que trocam de legenda constantemente, impunemente;

Porque o sistema representativo é um engodo que conta com a participação do próprio eleitor, que não raro exige, em troca do voto, algum proveito, de modo que o voto constitui, por isso, apenas um expediente para legitimar e perpetuar o crime, afinal os eleitos não representam o eleitorado, mas os seus próprios interesses e os interesses dos grupos econômicos que os patrocinam;

Porque, apesar das fraudes, insistimos em perpetuar determinados criminosos no poder, e a tudo assistimos passivamente;

Porque a Polícia, que deveria, junto ao Ministério Público, formar instituição única, está subordinada ao Poder Executivo, de sorte que são prováveis investigados (Governadores, Prefeitos etc.) que em última análise comandam as investigações;

Porque criminosos políticos estão protegidos por um sem número de privilégios (foro privilegiado, imunidades parlamentares etc.) que os tornam grandemente imunes às investigações;

Porque a corrupção política traduz a nossa própria hipocrisia, a nossa indiferença, a nossa tendência ao jeitinho; afinal, corrupção é de algum modo interação/acordo entre corruptor e corrompido, entre eleitor e eleito;

Porque somos obrigados a votar, quando votar é um direito e não um dever, pois o eleitor tem, há de ter, a liberdade de votar em quem quiser, quando e se quiser, consciente e livremente;

Porque a democracia, essa desgastada metáfora, é uma palavra que remete a múltiplas relações de poder que nada têm de democráticas, relações frequentemente de violência e tirania e permanentemente em mutação (Michel Foucault);

Porque punir criminosos, embora necessário, não é o mais importante; o mais importante consiste em identificar as estruturas de poder que possibilitam o crime e mudá-las radicalmente, pois problemas estruturais demandam intervenções também estruturais e não apenas intervenções sobre indivíduos;

Porque, em vez de enfrentar os problemas em suas causas, em suas raízes, tentamos combatê-las em suas consequências, tardia, burocrática e simbolicamente; e isso equivale a não combatê-las;

Porque temos um Estado excessivamente burocrático, que tudo pretende resolver por meio de leis, demagogicamente;

Porque multiplicar leis não significa evitar novos crimes, mas multiplicar novas violações à lei (Beccaria); e as leis desnecessárias enfraquecem as leis necessárias (Montesquieu);

Porque mais leis, mais juízes/tribunais, mais conselhos, mais prisões etc, pode significar mais presos, mas não necessariamente menos delitos (Jeffery);

Porque o povo brasileiro acredita ser livre, mas está enganado: é livre apenas durante as eleições dos membros do Executivo e do Parlamento, pois, eleitos os seus membros, ele volta à escravidão, é um nada (Rousseau); é que a participação popular se limita ao sufrágio a cada quatro anos; mas eleitos “seus” representantes, não se tem qualquer controle sobre seus atos, e o cidadão, convertido em objeto e não sujeito da política, só poderá expressar sua indignação nas eleições seguintes;

O Brasil é e continuará sendo um país corrupto simplesmente porque está estruturado para sê-lo!

Paulo Queiroz é Professor Universitário (UniCEUB) e Procurador Regional da República em Brasília)

Aviso: Os artigos são de inteira responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do Agenda Capital.

2 COMENTÁRIOS

  1. Reflexão…
    Quando a contaminação vem da base (Corrupção no Brasil)…
    Raízes profundas… Cortam folhas, frutos, galhos, mas não se consegue extirpar a planta… Parece que ela nasce é com muito mais força!
    Solo composto por ignorantes… Irrigado por espertalhões e ladrões da pior espécie, cheios de maldades, fazendo jogo com os índios inocentes… Exploração, exportação da exploração através da escravidão… Escravidão mascarada, perpetuada até hoje.
    Triste, mas infelizmente é muito difícil acreditar que conseguiremos vencer essa praga… E o pior, é que quando existe boa intensão, acaba morrendo por se ver impotente em meio a tanta coisa errada: morre entalada, sufocada, indignada, e no lugar onde florescera como esperança, uma nova erva daninha brota com força.
    A nossas raízes precisam ser arrancadas, precisamos renascer com nova estrutura, de plantas boas, que trazem oxigênio, vida e não tanta destruição!
    É difícil ter que admitir a necessidade de se extinguir, aceitar não só renascer, mas sermos recriados e cultivados com valores!
    Continuará?

  2. Excelente a dissecção perpetrada pelo Professor Paulo Queiroz, que expõe as vísceras da corrupção e justifica a continuidade no looping, onde todo o sistema se pereniza… A ampla reforma desse degenerado sistema é a saída, postergada, injustificadamente….

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