Cresce o número de pessoas que aguardam o atendimento na rede pública em mais de 70% desde abril deste ano

Por Otávio Augusto /CB

Em sete meses, a fila de pacientes para o tratamento de radioterapia cresceu 71,4% na capital federal. São 1,2 mil pessoas que aguardam para fazer sessões. Em abril deste ano, eram 700. A Secretaria de Saúde trabalha em um plano de ampliação para o serviço, mas as principais mudanças só devem se concretizar em 2018. Hoje, somente dois aparelhos funcionam em todo o DF — ambos estão no Hospital de Base. A máquina mais nova é de 1982. Pelo cálculo do Ministério da Saúde, seriam necessários seis equipamentos para a cidade, um para cada 500 mil habitantes.

A Secretaria de Saúde sequer consegue cumprir a Lei Federal Nº 12.732 de 2012 que prevê o início dos tratamentos de câncer em até 60 dias no Sistema Único de Saúde (SUS). Em média, o tempo de espera para  a primeira sessão de radioterapia na capital federal é de 120 dias, de acordo com estimativa do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem. O Correio apurou que os equipamentos disponíveis não têm contrato de manutenção. Quando quebram, ficam cerca de 45 dias parados.

Para minimizar o deficit, a pasta lançou um edital com o objetivo de contratar clínicas particulares a fim de complementar a assistência. O problema é a remuneração do serviço. De acordo com a tabela do SUS, o governo desembolsa R$ 5,5 mil, em média, a cada paciente atendido — montante que não é atualizado há sete anos. O valor pouco atrativo desanima empresários, que não se credenciam para ofertar a terapia. Considerando a dificuldade, a Secretaria de Saúde aprovou, junto ao Conselho de Saúde do DF, um padrão próprio. Na proposta, o governo se dispõe a pagar cerca de R$ 11 mil por tratamento.

O Executivo local tenta articular um convênio com o Hospital Universitário de Brasília  (HUB), que tem um equipamento. A unidade está em obras para receber uma segunda máquina do governo federal. Será instalado também um equipamento no Hospital Regional de Taguatinga (HRT), mas as obras de isolamento de radiação só ficam prontas daqui a um ano e meio. Outra alternativa é a implantação do Hospital do Câncer, que manteria dois aparelhos.

Três clínicas, segundo a Secretaria de Saúde, estão aptas a complementarem a rede. O Instituto de Radiologia de Taguatinga (IRT) e os hospitais Santa Lúcia e Sírio-Libanês.  “Estamos negociando a quantidade de vagas e o interesse das empresas em participar do processo. Agora, é aguardar as ofertas. A tabela SUS é defasada, e paga menos de um terço do que o setor privado, mas compensamos esse valor”, diz o subsecretário de Atenção Integral à Saúde, Daniel Seabra. Até o momento, somente o IRT manifestou interesse em disponibilizar 25 sessões por semana. As outras instituições ainda não se pronunciaram.

“A fila cresce porque o Estado não tem condições de atender, mas avançamos no processo de instalação de novos aparelhos. Estamos fazendo uma programação com sete equipamentos, o que seria suficiente para  3,5 milhões de habitantes”, argumenta Daniel.

radioterapia2.Outra medida para dar celeridade é a troca de um dos aparelhos do Hospital de Base — um modelo da década de 1970. Entretanto, as máquinas modernas ocupam mais espaço que a da sala da unidade e seriam necessárias alterações na infraestrutura. “Buscamos ajuda no Ministério da Saúde para procurarmos um aparelho que coubesse no espaço somente com reforço no isolamento da radiação”, completa Daniel. Os equipamentos pleiteados pelo Executivo local fazem parte de um plano de 2012 do Ministério da Saúde (leia Memória).
Falhas

Durante 34 anos, não houve nenhum investimento no setor de radioterapia. Um conjunto de fatores, como a evolução tecnológica, o alto custo do tratamento (custeado quase totalmente em dólar) e a falta de planejamento é a explicação para o panorama, segundo avaliação do governo, dificuldade que se estende a todo o país. “Ao longo do tempo, pouco foi investido em equipamento de radioterapia no Brasil. É uma tecnologia que exige investimento de infraestrutura muito grande”, ressalta Viviane Rezende, coordenadora de Atenção Especial à Saúde da Secretaria de Saúde (veja Cinco perguntas para).

Rafael Gadia, da Sociedade Brasileira de Radioterapia, acredita que o maior gargalo é o subfinanciamento do setor. Para o especialista, a formação de técnicos não seria problema no DF. “O desafio é incorporar a alta tecnologia e resolver o problema de hoje para, depois, executar o planejamento do futuro”, critica.

Cinco perguntas para Viviane Rezende, coordenadora de Atenção Especial à Saúde da Secretaria de Saúde

Mesmo com os incentivos do Ministério da Saúde, o DF enfrenta dificuldades em manter o tratamento de radioterapia. O que acontece?

A máquina pública é lenta e defasada. Disponibilizar o terreno para o equipamento nem sempre é fácil. Temos uma série de problemas. O impacto das obras, com as licenças de trânsito e ambientais são difíceis. Nossos hospitais são antigos. A área do Hospital Regional de Taguatinga destinada para a implantação de um aparelho de radioterapia fica do outro lado da rua. A questão é complexa. A oncologia exige tecnologia pesada.

As empresas privadas e o governo não investem no setor. Por quê?

Em Sergipe, por exemplo, só têm dois equipamentos para o estado inteiro. Ambos são da rede pública e não há nada na rede privada. É uma tecnologia muito cara e quem adquire tem de pagar em dólar. Esse é um fator limitador. A rede privada tem medo de investir porque o retorno não é imediato e é muito caro. Veja a cotação do dólar. Depois disso, é preciso gente especializada para trabalhar. Não é em todo lugar que se tem um radioterapeuta, um médico no local, um técnico de radiologia. Em média, leva-se um ano de treinamento para operar a máquina. Esse problema não é exclusividade do DF.

A alta demanda é fator complicador? 

Recebemos muitos pacientes de fora do DF que buscam atendimento aqui. Isso aumenta demais a demanda. Tentamos fazer do jeito que podemos. As perspectivas de melhorias são importantes; por isso, buscamos novos aparelhos. Não temos condições, sozinhos, de expandir; por isso procuramos o Ministério da Saúde. Vamos conseguir ampliar com equipamento de ponta.

Os aparelhos disponíveis no DF são bastante antigos. Isso prejudica os pacientes? 

Hoje em dia, temos equipamentos que reduzem os efeitos colaterais. Os nossos equipamentos podem ser usados, mas têm tecnologias mais modernas que expõem menos o paciente. Para consertarmos as máquinas, dependemos de peças canibalizadas de outras. Nenhuma empresa quer fazer a manutenção. Ninguém investe e vira sucata.

Os investimentos previstos pelo governo serão suficientes?

Vai ser um divisor de águas para o DF. A semente foi plantada, agora, estamos adubando. O trabalho começou na gestão passada. Se não tivesse sido feito, a situação estaria pior. Todos os nossos cálculos não são feitos aleatoriamente. Eles respeitam portarias que levam em conta a base populacional. São questões técnicas. E virão uma série de programações para o futuro, como concursos para radioterapeutas.

Plano de recuperação

O Ministério da Saúde publicou, em 2012, a portaria nº 931, que previa a aquisição de 80 aceleradores lineares para serem disponibilizados no Sistema Único de Saúde (SUS). O plano previa a instalação de uma fábrica de aparelhos de radioterapia no Brasil e a formação de centro de treinamento para os profissionais que operariam essas máquinas. Além disso, a pasta deveria custear 30% das obras de infraestrutura. Mesmo assim, as unidades da Federação não conseguiram financiar o restante. Por vários problemas, apenas duas máquinas foram instaladas — uma em Feira de Santana (BA) e outra em Campina Grande (PB). A implantação de serviços de radioterapia em locais mais carentes tem caminhado lentamente e não há previsão de quando as máquinas serão instaladas. À época, o orçamento de cada máquina ficou em R$ 8 milhões.

Da Redação com informações do CB

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