Centro Administrativo de Taguatinga, até hoje está numa disputa judicial. Foto: reprodução

BRASÍLIA – Um condomínio de luxo em uma área de 182 mil metros quadrados, com prédios de alto padrão, 3 mil vagas de estacionamento, áreas livres, jardins, espaços para restaurantes, bancos, lojas e supermercado. Há dois anos, toda essa estrutura erguida para abrigar, em um único local, a sede do governo do Distrito Federal e seus 13 mil servidores, está fechada, sem nunca ter sido utilizada.

No lugar da promessa de revolucionar a gestão pública e reduzir os custos da capital federal, o Centro Administrativo do DF, construído em Taguatinga, a 22 quilômetros do Palácio do Buriti, se converteu em uma vila fantasma, onde uma manada de elefantes brancos já dragou cerca de R$ 1 bilhão em investimentos.

Por trás de um dos maiores escândalos de irresponsabilidade de gestão pública em todo o País está um relacionamento de intrigas infindáveis entre o governo do DF, que atravessa a pior crise financeira da história, e a concessionária Centrad, formada pelas empreiteiras Odebrecht e Via Engenharia, ambas investigadas na Operação Lava Jato por envolvimento com esquemas de corrupção.

O plano de colocar vários órgãos públicos de Brasília em um único CEP teve início em um contrato de parceria público-privada firmado em 2009 pelo então governador José Roberto Arruda, que acabaria preso pela Polícia Federal naquele ano, acusado de envolvimento com pagamento de propina.

A ideia era simples. A Centrad construiria o complexo com recursos e financiamentos próprios. Depois disso, poderia explorar comercialmente toda a estrutura de serviços pelo prazo de 22 anos. O governo do DF pagaria uma parcela de R$ 22 milhões por mês para a concessionária. Parte desse valor pagaria uma prestação pela infraestrutura e outra parte, pelos serviços prestados. Ao fim dos 22 anos, portanto, o governo do DF desembolsaria cerca de R$ 6 bilhões pelo Centrad.

Após passar por uma cruzada de processos administrativos e judiciais, a obra começaria efetivamente só em 2013. No ano seguinte, mais precisamente no dia 31 de dezembro de 2014, o então governador Agnelo Queiroz, no último dia de seu mandato, foi até o Centro Administrativo do DF e disse que a estrutura estava inaugurada, sem haver, contudo, nenhum tipo de estrutura de escritório disponível, como mobília, rede de telefonia ou equipamentos de informática. Naquela mesma ocasião, a gestão Agnelo tratou de liberar o Habite-se do projeto, o que permitiria que a Centrad começasse a receber suas mensalidades do governo. Esses pagamentos jamais ocorreriam.

Habite-se. Ao assumir o Palácio do Buriti, o novo governador, Rodrigo Rollemberg, passou a criticar duramente os termos do contrato firmado com as empreiteiras e a entrega da obra. Em janeiro de 2015, uma liminar da 4.ª Vara de Fazenda Pública do DF suspendeu a carta de Habite-se do empreendimento e travou os pagamentos que o governo começaria a fazer para a Centrad.

No mês seguinte, o Habite-se foi declarado nulo, por causa de “ausência de execução de medidas mitigadoras dos impactos no trânsito da região”. A concessionária chegou a conseguir uma decisão favorável em julho de 2015, para que o governo começasse a pagar as mensalidades, mas nada foi repassado.

Leany Lemos, secretária de planejamento, orçamento e gestão do DF, diz que a posição do governo é clara. “Uma PPP só existe quando algo é entregue corretamente, para que você receba a prestação de serviços. Não foi o que encontramos. Por isso, vivemos esse drama”, disse. “A Controladoria apontou mais de 20 casos de irregularidades e pendências na obra e no contrato. A ordem de serviço foi dada um ano depois de iniciada a obra. As garantias não foram constituídas, não foram assinadas até hoje. A orientação do nosso jurídico, portanto, é de que temos que assumir todos os erros do contrato e do projeto.”

Sem receber as mensalidades desde janeiro de 2015, a Centrad decidiu jogar a toalha e, em outubro de 2016, propôs a “rescisão amigável” do contrato. Nas contas da empresa, há cerca de R$ 1,4 bilhão a receber do DF, sendo R$ 1 bilhão relativo aos gastos com as obras e outros R$ 400 milhões ligados a custos com financiamento e os dois anos de mensalidades da parceria público-privada.

Por meio de nota, a Centrad informou que “a demora do governo em solucionar questões sob sua responsabilidade e a inadimplência com a concessionária levaram a essa etapa de negociação”, mas que Rollemberg ainda não se manifestou. “O investimento feito até agora no complexo ficou integralmente a cargo da Centrad e o GDF ainda não fez qualquer pagamento devido ao parceiro privado.”

O governo do DF declarou que analisa a possibilidade de reformular os termos do contrato ou de fazer sua rescisão. Na prática, é sabido que se esgotaram quaisquer chances de manter o contrato e o fim da parceria é visto como a única alternativa. A questão é saber em que condições. Tudo indica que a confusão vai parar na Câmara de Arbitragem do DF.

 Credores querem que o governo assuma dívida

Seja qual for o destino que será dado ao Centro Administrativo do DF, governo e empreiteiras precisam responder de onde vai sair, afinal, o dinheiro que pagará o financiamento bilionário que bancou o projeto. Para construir o condomínio, o consórcio Centrad, formado pela Odebrecht e pela Via Engenharia, tomou empréstimo de R$ 604 milhões com a Caixa e de R$ 100 milhões com o Santander. O dinheiro está enterrado no concreto, no granito vermelho e nos vidros fumê do complexo. O consórcio deveria ter começado a pagar o financiamento em 2015, mas não quitou nenhuma mensalidade. Com juros, o passivo já ultrapassa R$ 1 bilhão.

Os bancos têm conversado com o governo para assumir a dívida do Centrad. Como se trata de empréstimo com dados financeiros consolidados e menos controversos que os demais custos que o consórcio quer cobrar do governo, o tema é avaliado. A questão é saber como o Distrito Federal, quebrado financeiramente, com atrasos de salários de servidores públicos, vai assumir a dívida.

A Caixa diz que “a operação é protegida por sigilo bancário e não irá se manifestar”. O governo não comenta o tema, mas diz e buscar uma solução. A Centrad diz que bancou todo o investimento e que o DF não pagou nada. “Dessa forma, a concessionária se encontra em situação financeira delicada, em especial com relação às obrigações com seus financiadores.”

Gestão atual diz que projeto não traz economia

Os argumentos criados para justificar um projeto de infraestrutura que custaria cerca de R$ 6 bilhões aos cofres públicos se baseavam, principalmente, na economia que o projeto poderia gerar ao governo do DF.

As contas dos ex-governadores apontavam para uma economia mensal de R$ 9,5 milhões por mês – com a redução de gastos com aluguel, segurança e serviços de manutenção, entre outros. A gestão atual, no entanto, conforme apurou o Estado, está convencida de que não há garantias de que a mudança possa gerar economia.

“O GDF fez um estudo próprio, contabilizando todos esses itens. A realidade é que não chegamos a esse valor. Não há economia. Basicamente, chega-se ao mesmo custo que temos hoje”, disse a secretária de Planejamento, Orçamento e Gestão do DF, Leany Lemos.

O governo brasiliense fechou um contrato de consultoria com o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (Unops) para encontrar uma saída para o Centro Administrativo.

Oficialmente, o governo afirma que tem analisado tudo o que é necessário para viabilizar a mudança do Executivo e seus 13 mil servidores para as estruturas de Taguatinga. Nos bastidores, porém, não há nenhum entusiasmo para trocar de endereço e é sabido que parte da gestão atual já defende que se estude outro destino para o centro administrativo.

Da Redação com informações do Estadão

2 COMENTÁRIOS

  1. Com uma construção idealizada por um Governo do Distrito Federal e mantida pelo próximo
    governador, ocupando área pública e custos elevados ao Estado poderia ser esquecida pelos governos atuais?
    Hoje, passamos por uma crise junto à saúde pública, devido a implantação de Unidades de Pronto Atendimentos à Saúde do Distrito Federal – UPAS, onde não há profissionais e nem equipamentos para um atendimento adequado.
    Sabendo deste problema e do Buritinga não ser inaugurado, deveria o Governo utilizar o Espaço para montar um Hospital Geral de Taguatinga – Buritinga, com equipamentos adequados para uma prestação de serviço adequada ao cidadão da Capital. Tendo em vista a necessidade de um local adequado para tratamento de varios tipos de problemas de saúde.
    A União auxiliaria o Governo de Brasília, na reforma adequada e a prestação de serviços qualificados à saúde de todo o Distrito Federal e auxiliaria o Governo Federal com atendimento de qualidade.

  2. Há muitas razões para se mudar o GDF para Taguatinga. Tantas quanto os preconceitos. Fui eu quem deu a idéia de se construir um Centro Administrativo Distrital em uma das cidades satélites e não no Plano Piloto, sede da capital federal, ainda no Governo Ornellas. Este, ainda no tempo da ditadura, tentou implantar, sem sucesso, no mesmo local, o chamado Centro Metropolitano, hoje estação do metrô. Depois, como pode ser visto no Youtube – digite Centro Administrativo do GDF em Taguatinga (Buritinga) -, Arruda adotou a idéia , mudando o GDF para a sede da PM na QNG, em Taguatinga, iniciando a construção do Buritinga ao lado da Rodoviária de Taguatinga. Agnelo continuou e finalizou a obra, que tentou inaugurar sem sucesso. A PRINCIPAL RAZÃO: Brasília foi construída para ser capital federal. Por um equívoco histórico, transformou-se TAMBÉM em sede do Distrito Federal, gerando problemas sérios de trânsito de todas as cidades-satélites para o chamado Plano Piloto. Por incrível que pareça, milhares de usuários dos serviços públicos distritais e milhares de funcionários do GDF vão, todos os dias, para Brasília, que é capital federal, para resolver problemas distritais. Além disso, o Buritinga concentraria todos os serviços administrativos do GDF, atualmente dispersados em prédios com aluguéis altíssimos no Plano Piloto. A escolha do local, em Taguatinga, foi feita antes de haver Ceilândia e Samambaia. Hoje, o local ideal, como eu disse quando fui consultado, era na residência oficial do Governador, ao lado da EPTG e do Metrô. Mudar o Centro Administrativo para uma cidade próximo à capital é uma inteligente solução já adotada por muitas capitais, como Belo Horizonte, o caso mais conhecido. O que falta para implantar a solução, hoje transformada em problema em função da incompetência dos governantes, é encarar o caso e buscar a solução – grande parte dela causada pela burocracia e pela ma vontade dos próprios governantes, que preferem trabalhar nos palácios do Plano Piloto – e acham demérito trabalhar em cidade-satélite. Até quando?

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