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Tensões entre Estados Unidos e Irã prometem complicar investigação sobre o acidente

Por Redação*

O clima era de tensão em Teerã na manhã de quarta-feira, quando o voo internacional 752 da Ucrânia decolou, com destino a Kiev. Poucas horas antes, o Irã havia disparado mísseis contra duas bases no Iraque que abrigam tropas dos EUA, e as forças iranianas estavam em alerta por um contra-ataque americano.

Não havia nada de anormal na decolagem e subida do avião, de acordo com dados preliminares de satélite. Porém, minutos depois do voo, o Boeing 737 foi envolvido por chamas e despencou no chão, matando as 176 pessoas a bordo.

Na melhor das circunstâncias, determinar a causa de um acidente de avião internacional pode levar um ano ou mais de difícil trabalho investigativo e envolve investigadores de vários governos. Resolver o que aconteceu nos céus de Teerã pode ser ainda mais complicado, dadas as tensões entre o Irã, onde o avião caiu, e os Estados Unidos, onde ele foi construído pela Boeing, empresa que está em crise, após dois acidentes fatais anteriores com o modelo 737.

As consequências imediatas do acidente resultaram em declarações confusas e contraditórias da Ucrânia e do Irã. A Embaixada da Ucrânia no Irã emitiu inicialmente um comunicado excluindo terrorismo ou um ataque com foguete. Mas ela foi removida do site da embaixada e substituída por uma outra que dizia que era muito cedo para tirar conclusões.

“Todas as versões possíveis do que ocorreu devem ser examinadas”, postou no Facebook o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, acrescentando que especialistas ucranianos viajaram a Teerã para investigar e recuperar os corpos de ucranianos.

A incerteza também pode se espalhar pela indústria da aviação, que depende fortemente do 737-NG para viagens comerciais. E para a Boeing, o acidente é o mais recente de uma série de acontecimentos devastadores que assolaram a empresa desde o primeiro desastre do 737 Max na Indonésia, no fim de 2018.

O momento do acidente levantou suspeitas imediatas. O Irã disparou contra as forças americanas na quarta-feira em represália a um ataque aéreo que matou um importante general iraniano e o líder de milícias iraquianas apoiadas pelo Irã – o mais recente de uma longa sequência de escaladas.

Os investigadores devem colocar a possibilidade de um ataque “no topo de sua agenda”, disse Peter Goelz, ex-diretor do Conselho Nacional de Segurança em Transportes.

Na terça-feira, horas antes do acidente, a Administração Federal de Aviação impediu os aviões americanos de sobrevoar o Irã, alegando o risco de aviões comerciais serem confundidos com aeronaves militares. Várias companhias aéreas não americanas redirecionaram seus voos na quarta-feira para evitar passar sobre o Iraque e o Irã, de acordo com o Flightradar24. Em 2014, no início da guerra no leste da Ucrânia entre forças do governo e separatistas apoiados pela Rússia, um míssil russo abateu o voo 17 da Malaysia Airlines, matando 298 pessoas.

Um porta-voz das forças armadas do Irã, Abolfazl Shekarchi, disse que o acidente não foi resultado de nenhuma ação militar. “Estão espalhando propaganda de que o voo ucraniano foi um alvo”, informou à mídia iraniana, citando Shekarchi. “Isto é ridículo. A maioria dos passageiros deste voo eram nossos valiosos jovens homens e mulheres iranianos. O que quer que façamos é para a proteção e defesa de nosso país e nosso povo”.

Normalmente, o país onde ocorre um acidente lidera a investigação e inclui funcionários do país onde o avião foi produzido, bem como os países de onde eram as vítimas. Com os Estados Unidos e o Irã envolvidos em um conflito crescente e violento, logo ficou aparente que a cooperação poderia ser tensa. Na noite desta quinta-feira, os EUA informaram que vão participar da investigação.

Os gravadores de dados de voo, ou as caixas-pretas, foram recuperados do local do acidente e, em geral, são enviados ao fabricante do avião para análise. No entanto, o chefe da Organização de Aviação Civil do Irã, Ali Abedzadeh, disse à agência semioficial Mehr News que o Irã não enviaria os gravadores do voo da Ukraine International Airlines para a Boeing. “Não entregaremos a caixa preta ao fabricante e aos americanos”, pontuou Mehr. Mais tarde, o país mudou sua posição, e informou que vai colaborar com as investigações.

No entanto, a companhia aérea prometeu uma investigação completa, envolvendo funcionários da Ucrânia, do Irã e da Boeing. Zelenski disse que havia ordenado ao promotor-geral da Ucrânia que iniciasse uma investigação criminal sobre o acidente e que toda a frota de aviação civil do país seria verificada.

O 737 deixou o Aeroporto Internacional Imam Khomeini em Teerã às 6h12 da quarta-feira. Havia 176 pessoas a bordo, incluindo 9 tripulantes, de acordo com a companhia aérea, que divulgou os nomes dos mortos. As autoridades iranianas listaram 177, enquanto algumas organizações de notícias iranianas citaram outros números.

O avião atingiu uma altitude de quase 8 mil pés e uma velocidade de mais de 300 mph, de acordo com o Flightradar24, que rastreia as aeronaves pelos seus sinais de rádio. Dois a três minutos após a decolagem, foi abruptamente interrompida a transmissão automática de dados de voo, embora o avião tenha permanecido no ar por mais alguns minutos. Abedzadeh disse que a aeronave não entrou em contato com a torre de controle sobre uma emergência.

A Agência de Notícias dos Estudantes Iranianos, organização midiática estatal , exibiu um vídeo que, segundo ele, mostrava o acidente antes do amanhecer, com uma aeronave aparentemente em chamas à distância, descendo antes que uma explosão brilhante iluminasse o céu com o impacto. O New York Times identificou outro vídeo que mostrava o acidente de um ângulo diferente.

“Aquilo nos acordou”, lembrou Sajad Shirkhani, de 29 anos, que mora perto do local do acidente. “Saímos da cama e corremos para fora, e todas as janelas de nossa casa estavam quebradas. Corremos para fora, pensamos ter sido atingidos por um míssil, que havia uma guerra”.

O avião caiu em uma área agrícola perto da aldeia de Khalaj Abad, cerca de 16 quilômetros a noroeste de onde o sinal do avião foi registrado pela última vez pelo Flightradar24. O avião parece ter pousado no noroeste e voado por vários quilômetros depois que seu transponder parou de funcionar.

Fotos e vídeos do local do acidente mostraram equipes de resgate em meio a um campo cheio de destroços do avião, incêndios e pertences de passageiros. Uma análise do Times sugere que a aeronave estava retornando ao aeroporto de Teerã, quando caiu.

Houve discordância quanto às nacionalidades das vítimas, embora isso possa ter acontecido porque alguns passageiros tinham dupla cidadania; a contagem do Irã incluiu 147 iranianos e 2 canadenses, enquanto Vadym Prystaiko, ministro de Relações Exteriores da Ucrânia, disse que havia 82 iranianos e 63 canadenses.

“Nosso governo continuará trabalhando em estreita colaboração com seus parceiros internacionais para garantir que este acidente seja completamente investigado e que as dúvidas dos canadenses sejam esclarecidas”, garantiu Justin Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, em comunicado.

Outra teoria sobre o acidente foi que um dos dois motores do avião falhou. Qassem Biniaz, funcionário do Ministério Iraniano de Estradas e Desenvolvimento Urbano, disse à Agência de Notícias da República Islâmica, a agência de notícias oficial do governo, que um motor do avião pegou fogo e o piloto não conseguiu recuperar o controle. 

*Com informações do The New York Times

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