Luís Felipe Belmonte. Foto: Delmo Menezes / Agenda Capital

“Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política,
simplesmente serão governados por aqueles que gostam.” (Platão)

Por Luís Felipe Belmonte*

Depois de quase uma década vivendo na Inglaterra, o desejo de criar um instituto para atender crianças carentes foi um dos motivos que me fez retornar ao Brasil. Sabia do sofrimento da população e das más condições de saúde, educação e segurança. Mesmo assim me surpreendi com o que vi e ouvi nos locais visitados. O que mais me impressionou foi saber que tão próximo ao Palácio do Planalto — a cerca de 20 quilômetros — pessoas vivem em condições de miséria absoluta. Sol Nascente, Pôr do Sol, Santa Luzia e Estrutural são apenas alguns desses locais.

Percebi que a política não tinha chegado lá e que precisava fazer alguma coisa além do instituto. A partir daí — eu e minha esposa, Paula — buscamos um mandato político para colocar em prática tudo aquilo que pensamos de forma a contribuir para uma sociedade melhor.

Entendo que as reformas econômicas que estão sendo discutidas e votadas pelo Congresso são necessárias ao crescimento do país. Mas a sociedade somente se desenvolverá de forma sustentada a partir da mudança na cultura política.

Um dos pontos primordiais dessa transformação é o princípio da verdade, que norteia muitas nações democráticas. Infelizmente, o sistema atual não prevê mecanismos que obriguem os candidatos a terem compromissos com suas promessas de campanha. Isso é muito ruim, porque gera o descrédito da sociedade em relação à política.

Em alguns países existe o recall, um sistema pelo qual o governante, após eleito, poderá perder o mandato caso não cumpra as promessas de campanha. É uma alternativa para garantir que candidatos não se elejam baseado em mentiras.

Outro ponto que considero importante, embora não seja necessariamente uma mudança legislativa, mas cultural, é um conceito simples que Margareth Thatcher implantou na Inglaterra: “Não existe dinheiro público, existe dinheiro do contribuinte”.

Ao entender a diferença entre dinheiro público e dinheiro do contribuinte, a sociedade passará a cobrar mais transparência na aplicação dos recursos estatais. E, certamente, não aceitará que o dinheiro seja desviado de sua finalidade, principalmente para atender interesses pessoais ou partidários.

Enfim, o Brasil precisa de uma reforma política profunda, e não só de mudanças pontuais nas legislações partidária e eleitoral, como as que foram aprovadas pelo Congresso nos últimos anos. Discutir sobre tempo de propaganda, embora importante, não é fundamental. Uma reforma política precisa enfrentar questões mais sérias como a implantação do voto distrital ou distrital misto, por exemplo.

Esse é o tipo de proposta que pode, sim, melhorar a vida da população. Primeiro, porque diminui muito a força do poder econômico nas eleições e torna a campanha mais barata, seja municipal, seja estadual, seja federal. Depois, por vincular o político eleito ao grupo ao qual representa. A questão do financiamento de campanha também faz parte dessa reforma e precisa ser rediscutida imediatamente. A aprovação do financiamento público não melhorou o Brasil. Tanto que vimos espocar por todo país denúncias de candidatos laranja e desvios das verbas públicas no último pleito.

É inadmissível que o contribuinte brasileiro tão sacrificado ainda seja obrigado a financiar campanha eleitoral. O dinheiro dos impostos deve ser usado para saúde, educação, segurança, infraestrutura. Enfim, coisas que beneficiem diretamente a população não aos partidos.

A doação privada de campanha deve ser liberada com regras rígidas e claras. O empresário que doar para a um governante não poderá participar de licitações públicas. Dessa forma, será doação, não investimento, como assistimos no passado.

É oportuno alertar que há outro risco grande em relação à proibição da doação privada de campanha: o uso de dinheiro em espécie por meio do caixa dois, sem que seja possível a comprovação. Nesse caso, os candidatos financiados pelo crime organizado ou pelas organizações religiosas podem ser amplamente favorecidos em relação aos demais. São questões que precisamos ficar atentos.

A legislação partidária é outro ponto que precisa ser colocado na pauta de discussão. O excesso de partidos faz com que os candidatos se filiem apenas por conveniência, sem nenhuma afinidade ou viés ideológico. Infelizmente, no Brasil, não há uma linha de atuação das legendas partidárias, como ocorre na Inglaterra, por exemplo. Lá é inconcebível que alguém do Partido Trabalhista se filie ao Partido Conservador, pois existe uma identidade política. Aqui, a identidade é a da conveniência.

Todos esses argumentos mostram que a reforma política é fundamental sim. Por meio dela, vamos conseguir melhorar a representatividade no Congresso e, consequentemente, ter mais seriedade na elaboração das políticas públicas. A partir de uma consciência política mais crítica teremos um ciclo virtuoso, que começa pelo voto consciente e resulta na diminuição da corrupção. Somente assim, teremos melhores condições de atender aos mais necessitados.

*Luís Felipe Belmonte – Advogado com ênfase nas áreas do Direito Constitucional, Direito Cível e Direito Administrativo. Sócio fundador do Escritório Luís Felipe Belmonte & Advogados Associados e 1º suplente de Senador da República.

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