Raimundo Ribeiro - Advogado, Ex-secretário de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania e ex-deputado Distrital.

Por Raimundo Ribeiro*

Neste final de domingo, o Brasil foi dormir estupefato com a revelação de mensagens trocadas pelo então juiz, hoje ministro da justiça Sérgio Moro e os procuradores da operação Lava Jato. O conteúdo delas é de espantar mesmo, pois se verdadeiros os diálogos, documentam fatos graves; mas antes de tecer considerações acerca do conteúdo, imperioso destacar o seguinte: Obter mensagens por ação de “hackers” é ilegal, mas a divulgação não é, cumprindo lembrar que eventuais reparações podem ser requeridas pelos caminhos legais, mas a censura prévia não é admitida (vide jurisprudência reinante, até agora). Quanto ao conteúdo, se falso, estaremos diante de mais um fake News que merece repúdio.

Por outro lado, se o conteúdo é verdadeiro, estaremos diante de fatos gravíssimos, pois revela ações conjuntas entre órgão acusador e Juiz-Estado, inadmissíveis num Estado de direito, pois causam prejuízos irreparáveis à atividade fim do Estado de promover a Paz Social, fazendo Justiça.

Alguns argumentam que a ação dos hackers foi criminosa; sim, é verdade, mas isso não significa que os fatos noticiados não devam ser investigados.

Os acusados dizem que a divulgação é um ataque à Lava Jato; não é verdade, a divulgação dos fatos, se verdadeiros é um ataque às práticas ilícitas de agentes públicos que teriam abusado das prerrogativas inerentes às funções públicas que ocupam para desvios de finalidades com objetivos ainda não esclarecidos.

A investigação imediata se impõe em razão da gravidade dos fatos, pois sendo verdadeiros, retirou do processo penal a principal viga que o alicerça, isto é a imparcialidade do Estado representado pelo Juiz, o que fere de morte qualquer julgamento.

Poderia aqui invocar o que os investigados utilizam corriqueiramente, o que indevidamente chamam de princípio (in dúbio pro societate), mas se o fizesse seria um ato de desonestidade intelectual pois nem eu nem a lei reconhecem tal “princípio”. Se verdadeiros, os acusados teriam corroído os alicerces do processo penal e aqueles que ainda teimam em afirmar que as relações próximas entre o órgão acusador e o Estado Juiz são normais, seria importante que lessem com isenção o que estabelece o artigo 8o. Da Lomam: “O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.

Trechos das conversas:

Moro – 18:32:37 – Opinião: melhor ficar com os 30 por cento iniciais. Muitos inimigos e que transcendem a capacidade institucional do MP e Judiciário.”

“ Talvez fosse o caso de inverter a ordem das duas planejadas.”

“Não é muito tempo sem operação?”

“Não pode cometer esse tipo de erro agora,”

“Deveríamos rebater oficialmente?”

Todas as frases acima atribuídas ao então juiz, e não negadas, demonstram claramente a incompatibilidade inconciliável entre a lei que rege a magistratura e o então juiz acusado.

Numa frase orienta, noutra questiona a demora, noutra repreende e na última confessa a “parceria” ilegal entre o órgão acusador e o Estado-juiz.

Cumpre relembrar que o processo penal é uma garantia da sociedade de que se algum dia for julgado, será na forma da lei com a garantia de um julgamento por juiz imparcial e não por quem o vê como inimigo e, às escondidas manipula a lei e se junta ao órgão acusador traindo os ideais funcionais que tinha o dever de honrar.

Se as condutas descritas agridem a sociedade de modo geral, no específico mutila o exercício da advocacia quando retira a viga mestra da igualdade, isonomia e imparcialidade do julgamento.

Diante disso, imperioso que o advogado combata as ilegalidades supostamente praticadas, não apenas como um dever do cidadão, mas como dever decorrente do compromisso que assumiu pela defesa intransigente da legalidade.

*Raimundo Ribeiro – Advogado (OAB-DF 3.971); Ex-secretário de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania; Ex-deputado distrital. (Colunista do Agenda Capital).

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