Kiev, capital da Ucrânia.

Baladas em Kiev, sirenes em Lviv, cemitérios em Bucha. A reportagem do Estadão esteve durante oito dias no país e registrou desde a vida comum nas cidades distantes do front até os impactos ainda presentes das ocupações e bombardeios russos

Por Carolina Marins

O Estadão passou oito dias na Ucrânia, entre os dias 19 e 26 de maio, onde visitou a cidade fronteiriça de Lviv, conhecida pelo seu valor cultural; a capital altamente protegida de Kiev; a região de fronteira com a RússiaChernihiv, onde os combates ainda são ativos; e as cidades da região metropolitana de Kiev que foram ocupadas pelas tropas russas em 2022: Irpin, Bucha e Borodianka, bem como os vilarejos de Moshchun e Andriivka.

No minidocumentário “A vida na Ucrânia em guerra”, a reportagem traz os cenários que encontrou depois de mais de dois anos da invasão em larga escala promovida pela Rússia de Vladimir Putin. Desde a tranquilidade de estar vivendo em cidades distantes do front ou com sistemas de defesa poderosos que permitem aos ucranianos festejar, passando por regiões onde o medo do retorno russo ainda é uma realidade.

O primeiro desafio é chegar até a Ucrânia. Não é possível ir ao país de avião, o que torna a viagem um roteiro de quase dois dias inteiros para ir e mais dois dias para retornar para São Paulo. O mais próximo que é possível chegar pelo ar é até Polônia. O Estadão aterrissou em Varsóvia, capital da Polônia, e seguiu o restante da viagem de carro. Foram quase 5h até a fronteira polonesa-ucraniana, 1h de checagem rigorosa de documentos e mais 1h até a cidade de Lviv.

Em Lviv, considerada um reduto seguro em um país em guerra, a frente de batalha é fisicamente distante, mas os resquícios do conflito estão por todo lado. A cidade viu a sua população dobrar conforme uma onda de deslocados chegava vindo do sul e do leste do país. Classificada como Patrimônio Mundial em Perigo pela Unescoespaços históricos e culturais são fortemente protegidos de uma guerra onde o patrimônio imaterial se tornou um campo de batalha. Apesar da distância, as constantes sirenes de ataques aéreos são um lembrete quase diário do estado de guerra.

Kiev, na Ucrânia. Na foto, Liudmyla Svetska — Foto: Janaina Figueiredo / O Globo

Em um trem que percorre durante toda a noite, a reportagem chega à capital Kiev, onde os impactos da guerra parecem ainda mais distantes. Com plena confiança nos poderosos sistemas de defesa aérea que receberam dos aliados ocidentais, os ucranianos disfrutam de uma vida quase totalmente normal, com direito a bares e restaurantes lotados e baladas que ocorrem durante o dia. Os principais resquícios da guerra estão nos memoriais aos mortos no conflito, aos cemitérios de veículos militares abatidos e prédios do governo altamente protegidos.

Em Kiev, ucranianos adotam ‘modo de vida normal’ e evitam falar de guerra. Na foto dois atores convidam para a Casa de Teatro. Reprodução.

Aplicativo de alerta

O som das sirenes faz parte do dia a dia das pessoas, que, em sua grande maioria, têm em seus celulares o aplicativo Air Alert. Quando uma sirene toca, o aplicativo avisa imediatamente se o que foi lançado pelos russos é um míssil balístico ou de cruzeiro, informação essencial para que os ucranianos entendam se devem ou não se refugiar no bunker mais próximo. Moradores da cidade explicam que mísseis balísticos são mais perigosos, pois são mais difíceis de derrubar.

Onde a consequência do conflito ainda é muito latente, porém, é nos arredores da capital. As cidades da região metropolitana foram fundamentais para impedir a queda de Kiev para o Exército russo nos primeiros meses de 2022. Mais de dois anos depois, elas ainda lidam com o trauma dos crimes de guerra cometidos ali e tentam se reconstruir em meio aos escombros de prédios e casas destruídos.

Anna Lyashko e a filha Diana andar em parque de Kiev  

Fim de tarde em Kiev, clima primaveral, o Sol ainda ilumina uma cidade que nas últimas semanas enfrenta apagões diários, consequência dos ataques russos a centrais elétricas do país, e nas ruas próximas ao Golden Gate da capital ucraniana (construído em meados do século XI), dois jovens atores dançam na calçada e convidam quem passa pelo lugar a assistir à peça “Family Paradise” (Paraíso Familiar, em tradução livre). Nada do que se vê neste charmoso cantinho da cidade, como em tantos outros lugares de Kiev, lembra que a Ucrânia está, desde 24 de fevereiro de 2022, em guerra com a Rússia de Vladimir Putin.

Jovens dançam e sorriem durante festa em Kiev, na Ucrânia – Laura Boushnak

Nas regiões de fronteira com a Rússia a guerra também é uma realidade diária. Em Chernihiv, que divide fronteira com a Rússia e Belarus, ainda há combates diários nos vilarejos limítrofes, bem como tentativas constantes de incursão de forças russas. Ali, o medo de um retorno russo ainda assombra a população, que agora vê com atenção a nova ofensiva inimiga na região vizinha de Kharkiv.

O Estadão viajou para a Ucrânia em uma delegação de jornalistas latino-americanos a convite da Fundação Gabo, que tem um projeto para incentivar reportagens em cobertura de conflitos internacionais, em parceria com a organização Ukraine Crisis Media Center, da Ucrânia.

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Com Estadão/G1/Agências

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